sábado, 30 de outubro de 2021

1.2 - Origem dos Concelhos

Os estudiosos da história dos municípios, na segunda metade do século XIX e na primeira metade do século XX, ocuparam uma boa parte do seu tempo a discutir a origem do municipalismo.

Como na França, teve em Portugal muitos seguidores a doutrina que se veio a designar como romanismo, por defender a origem romana do município medieval e moderno. Nos antípodas desta doutrina, embora não dirigida especialmente para a história dos municípios, viria a estar a chamada teoria do ermamento, segundo a qual as invasões muçulmanas, conduzindo ao despovoamento do território, se tornaram responsáveis pela quebra de continuidade entre o mundo antigo e as comunidades que saíram da reconquista.

Como alternativa à doutrina do romanismo, a teoria que defende a origem germânica das nossas instituições municipais encontrou em Eduardo de Hinojosa o seu maior paladino e na Espanha e os mais elevado número de seguidores.

Embora os muçulmanos não tivessem qualquer tipo de organização que se pudesse comparar à dos municípios, a verdade é que muitas das suas instituições contribuíram com a sua herança para o desenvolvimento orgânico dos concelhos.

Finalmente, a luta pela liberdade, quer sob a forma de reacção contra a dinâmica avassaladora do feudalismo, quer sob a forma de obtenção de liberdades ou de franquias, adequadas ao desenvolvimento das actividades económicas, constitui um outro factor sem o qual não floresceria tão cedo a autonomia dos municípios. 

1. A herança romana.

É inegável a importância que teve a romanização na mudança dos hábitos dos povos conquistados e não se podem menosprezar as consequências daí resultantes para o rumo histórico seguido pela Europa.

Os romanos não se preocuparam apenas em estabelecer o seu domínio sobre o território, mas, até porque era o melhor meio de o governar em paz e de extrair dele todas as vantagens, procuraram atrair à sua causa os habitantes e levá-los a aderir ao seu estilo de vida e aos seus valores, que consideravam os mais avançados. E o melhor processo de transmitir esses valores foi a criação de estruturas idênticas às romanas, com a fundação de cidades ou a assimilação dos aglomerados urbanos existentes e a aplicação das normas jurídicas indispensáveis para o desenvolvimento desse estilo de vida[1].

 De par com a instalação de colónias, através do assentamento de cidadãos enviados por Roma, segundo um planeamento pormenorizado, os romanos promoveram à categoria de municípios vários centros urbanos anteriores à data da sua chegada, a que concederam todas as prerrogativas do direito romano. Através do exercício dos cargos municipais, os indígenas acediam à cidadania romana. As transformação destas comunidades em municípios dava-lhes a possibilidade de serem reconhecidas pelas autoridades imperiais e de funcionarem com autonomia. O executivo destas cidades era formado por um conjunto de magistrados, cujos mandatos tinham a duração de um ano: dois questores, dois edis e dois homens para dizer o direito (duumviri iure dicendo), isto é, para fazer justiça. Simplificando, de um modo elementar, podemos dizer que os questores se ocupavam das finanças, os edis da administração municipal e os duúnviros da justiça. No exercício das sua funções, tinham obrigatoriamente de levar em conta as decisões da assembleia dos decuriões – ordo decurionum – formada por várias dezenas de membros, incluindo magistrados que tinham terminado o exercício de funções, notáveis locais e homens livres possuidores de uma certa fortuna.

Designado como populus ou com outros nomes, o conjunto dos habitantes era responsável pela eleição dos magistrados locais. A Lei de Málaga definia com pormenor como se devia desenrolar o processo: a publicação do nome dos candidatos ou, se os não houvesse em número suficiente, a sua nominatio pelo magistrado que presidia – e nesse caso não se podiam recusar, a não ser que apresentassem um substituto – e a votação, feita por escrito[2]. Para se apresentar como candidato, era necessário ser livre, estar radicado na localidade, possuir bens de fortuna acima de um certo valor, fixado conforme as cidades, ter o mínimo de vinte e cinco anos de idade, exigindo-se a passagem de um certo período de tempo após o anterior exercício de outras magistraturas[3].

O território da Lusitânia conheceu uma significativa municipalização sob o domínio romano. Não foi por acaso que Plínio Antigo utilizou em relação a Olisipo a expressão “municipium civium romanorum“, que só excepcionalmente ocorre no conjunto da sua obra, e que a inscrição da ponte de Alcântara atribuiu a designação de municipium a um conjunto de cidades indígenas muito pouco conhecidas[4]. A municipalização de numerosos núcleos populacionais da Lusitânia testemunha um nível razoável de integração da província no mundo romano. Desde o tempo de Augusto até à época pós-flaviana foram criados os municípios de Olisipo, Ebora, Salacia, Myrtilis, Amaia, Bobadela, Capera, Collipo, Caesarobriga, Mirobriga, Sellium e provavelmente Balsa e Ossonoba, a que se juntavam os obscuros munícípos referidos na ponte de Alcântara: Igaeditani, Lancienses Opidani, Tapori, Interamnienses, Colarni, Lancienses Transcudani, Aravi, Meidubrigenses, Arabrigenses, Banienses e Paesures[5]. A norte da Lusitânia, o panorama é menos conhecido, salientando-se para o território português os casos de Bracara Augusta e de Aquae Flaviae, e, de modo semelhante ao que sucedia na ponte do Tejo, os municípios referidos na coluna de Chaves[6].

De qualquer modo, para além das colónias ou municípios de cidadãos romanos, havia apenas um tipo de município, designado como município de direito latino, após a outorga do ius Latii por Vespasiano ao conjunto da Hispania, em que a maioria dos habitantes mantinha o seu estatuto de peregrino[7], não se vislumbrando nenhuma razão para se multiplicarem as categorias de municípios e muito menos para admitir variantes na estrutura dos seus órgãos de governo, como iríamos supor se adoptássemos a teoria de Alexandre Herculano[8].

2. A teoria do ermamento.

Cláudio Sánchez-Albornoz defendeu que a organização municipal romana estava em decadência no sul das Gálias quando os visigodos aí chegaram e estabeleceram o seu reino, cujas fronteiras se alargavam até à actual Espanha[9]. Durante este período, já os soberanos godos confiaram o governo das províncias e cidades a funcionários a que chamaram comites ou judices. A Lex Romana Visigothorum, ditada para os galo-romanos e os hispano-romanos, em 506, um ano antes que os godos, derrotados em Vogladum, se refugiassem a sul das cordilheiras pirenaicas, reflecte as limitações que nessa altura tinha sofrido a autonomia e a própria organização municipal romana[10]. No Código de Alarico já não se encontram vestígios das antigas magistraturas: duumviri, aediles, quaestores...[11]. Apenas a Cúria mantinha, no tempo do Breviário, algumas das suas antigas funções, embora o número dos seus componentes tivesse diminuído e tendesse a diminuir cada vez mais, devido aos ónus que sobre eles pesavam, responsabilizando-os inclusive pelos impostos não arrecadados, embora nas Etimologiae e nas Differentiae de S. Isidoro de Sevilha, anteriores a 632, ainda haja algumas alusões a magistraturas e organismos do velho município[12]. Nos fins do século VI, os defensores e os numerarii, sobre os quais assentava a organização da vida pública, já eram nomeados pelo bispo ou eleitos pelo povo[13]. Em suma, “la nueva organización provincial, de la que hacía cabeza el judex o comes civitatis y de la que era la civitas la unidad geográfica, reemplazó muy pronto al viejo régimen municipal romano en la monarquía visigoda. Encargado en las ciudades, desde muy temprano y por delegación regia, el comes aut judex del regimiento, la hacienda y la justicia, su officium, es decir, sus oficiales subalternos, y los judices menores, que bajo su autoridad regían los territoria de la civitas y los loca de cada territorium, pudieron velar, y de hecho velaron, a la satisfacción de las necesidades todas de la vida pública de los habitantes de las antiguas civitates hispanas”[14]; a organização municipal romana, incompatível com o novo regime provincial e local da monarquia visigoda, estava, pois, definitivamente eclipsada.

Para colmatar o vazio resultante da extinção do antigo município, através do qual o populus de algum modo participava na vida pública, regista-se, no entender de Sánchez-Albornoz, a tendência para o reaparecimento da assembleia de homens livres do antigo mundo germânico. A Lex Visigothorum não se refere expressamente a esse tipo de reuniões, mas supõe a sua existência, assim como a de outras tradições germânicas, a que se opõe com veemência. Nela se revela “a luta entre a tradição não olvidada do mallum e o intento do Estado de impor as práticas processuais romanas”[15]. As gentes acorrem às audiências do judex em tal número e com tal interesse que a lei se preocupa em garantir a liberdade e a ordem do julgamento; para isso dispõe que as partes estejam representadas por igual número de litigantes, e autoriza o juiz a estabelecer a distância do lugar de onde julga, no que hoje chamaríamos a barra do tribunal, ao público numeroso que acorre para assistir, e a não consentir a entrada daqueles que possam prejudicar os litigantes[16]. O povo não acudia apenas aos julgamentos mas reunia-se nas praças ou no mercado para assistir à execução das sentenças que implicavam castigos corporais. Este conventus publicus ou conventus populi, especialmente nas povoações rurais, tratava também de questões económicas – gados mal parados, animais malfazejos, danos em prados, searas, vinhas e árvores de fruto, marcos divisórios de herdades, servos fugitivos, etc. – e, atento o seu ruralismo, o mesmo aconteceria em grande parte das cidades da monarquia visigótica[17]. Esses precedentes explicarão a intensa vida de que no reino astur-leonês fruíram os concilia[18], que tanta influência viriam a ter no aparecimento de um novo tipo de municipalismo.

Complementando a sua exposição acerca da ruína e extinção do município romano durante o período visigótico, Sánchez-Albornoz afirmava que “nenhum vestígio sobreviveu do município romano na Espanha moçárabe”[19]. Sob o domínio muçulmano, os cristãos peninsulares viram as suas liberdades coarctadas, autorizados apenas a regerem-se pelas suas próprias leis nas questões de direito privado e a cobrarem por si mesmos os impostos pessoal e territorial, yizia e jaray, que eram obrigados a pagar na sua condição de dimnies ou protegidos[20].

O regime de governo das comunidades que tinham capitulado, aceitando um estatuto de submissão, era uma simplificação do que vigorava nas cidades hispânicas quando se deu a invasão árabe: o conde, que exercia uma parte das funções do comes visigodo; o exceptor, que herdou do numerário o encargo de arrecadar os impostos, agora fundamentalmente constituídos pelo tributo de capitação e pelo imposto territorial; o censor, juiz de primeira instância, que correspondia aos juízes menores do sistema visigótico: vicarios, defensores e tiufados[21].

Se o município romano se extinguira sob o domínio visigótico, também o mundo árabe não conheceu qualquer instituição que se parecesse com os antigos municípios romanos, nem com os municípios medievais e modernos. As cidades hispano-muçulmanas foram governadas por funcionários nomeados directamente pelo poder central, isto é, pelos califas, embora a vida intensa e complexa dos centros urbanos tenha propiciado o aparecimento de um número considerável de magistraturas.

Se no sul da Espanha não se interrompeu a vida das antigas povoações hispano-romanas, embora sob diferentes regimes de governo, outro tanto não aconteceu no norte, pois “no reino astur-leonês não pode citar-se um só caso de uma cidade romano-visigótica de algum relevo que continuasse mais ou menos povoada, sem que jamais nela se interrompesse a vida, desde a época imediata à invasão muçulmana até aos dias da sua ocupação e restauração pelos cristãos”[22]. E Sánchez-Albornoz insiste: “todas as cidades dos montes do Douro tiveram de ser repovoadas e colonizadas de novo, desde a segunda metade do século IX em diante”[23].

Em conclusão, “nenhuma vinculação, nenhum enlace, por ténue e leve que seja, pode estabelecer-se entre o antigo regime municipal, definitivamente extinto na Espanha da reconquista, e o novo município medieval, que vai surgir, precisamente, nessa zona recém-povoada do reino astur-leonês”[24].

Era inevitável a pergunta: “Cómo surgió, entonces, la nueva organización municipal?”[25]. E a resposta de Sánchez-Albornoz foi a de que “El municipio medieval castellano leonés surgió como fruto maduro de la organización social, economica y política del Norte y sin  influencias ni injertos exteriores”, deixando, no entanto, “reservado el examen de tema tan vasto y tentador, para otra ocasión o para otro estudioso” [26].

Sánchez-Albornoz voltou de facto ao assunto, mas não com o pormenor e a extensão a que nos habituara a sua erudição e a riqueza do próprio tema faria prever. No estudo sobre a repovoação do reino astur-leonês[27], deteve-se a analisar o fenómeno, que se intensifica ao longo do século X, do aparecimento das vilas entendidas num sentido que já não é o da antiguidade romana, nem sequer o da Lex Visigothorum, em que era sinónimo de unidade fundiária, mas como aldeias ou povoados, habitados por pequenos grupos, geralmente de homens livres[28]. Uma grande parte dessas villas-aldeias são devidas à iniciativa de vários grupos de emigrantes, algumas surgem mesmo em resultado de uma presúria colectiva. Em muitos documentos que se lhes referem “parece segura la autónoma personalidad colectiva del grupo ou de los grupos humanos que realizaba ou realizaban o negocio juridico”[29]. De um modo geral, são proprietários os homens que habitavam essas aldeias, que aparecem a gozar de um estatuto concelhio embrionário. Desde o início do século XI, há notícias de localidades isentas da obrigação de pagar homicídio e rouso e da entrada do saião do Rei[30]. Há numerosas alusões a germes de concelhos rurais que tanto aparecem a exercer actos de jurisdição voluntária como até, presididos por um juiz, a julgar delitos capitais[31].

Sánchez-Albornoz, porém, não avançou mais nesta análise, desabafando: “está por investigar cientificamente esa asamblea rural asturleonesa que comparte el nombre de concilium con las reuniones del palatium regis y con algunas de la clericía”[32].

        3. O contributo “germânico”.

Eduardo de Hinojosa defendeu a teoria da origem germânica das nossas instituições municipais, que teve na Espanha um elevado número de seguidores. A perspectiva de Hinojosa não é, porém,  a do historiador do municipalismo, como a de Alexandre Herculano, mas a do historiador do direito.

O primeiro facto irrecusável para Hinojosa[33], como para outros historiadores, era a sobrevivência de instituições jurídicas ignoradas ou combatidas pela Lex Visigotorum, normalmente explicada como subsistência de práticas consuetudinárias que a legislação visigótica procurara extirpar, por as considerar opostas à soberania do estado ou à doutrina do cristianismo.

Até à primeira metade do século XIII, os documentos, especialmente os forais, raras influências acusam do direito romano, designadamente do direito penal e processual. A tradição germânica manifestar-se-ia a vários níveis, especialmente em relação à família, aos contratos e à justiça. Entre as práticas que terão sobrevivido a todas as proibições contar-se-iam a chamada vingança do sangue, a responsabilidade dos pais pelos delitos dos filhos, da mulher pelos do marido, dos habitantes de um termo municipal pelos crimes que dentro dele se cometessem, a penhora extra-judicial, a entrega da vicissitudo.

Hinojosa faz remontar ao passado germânico a tradição do matrimónio por compra, atestada ainda em documentos do século XIII, a comunidade de bens entre os esposos, a dependência paterna dos filhos solteiros, independentemente da idade, e a prática da adopção, frequente na Espanha da Idade Média. O conselho de família, constituído pelos parentes mais próximos, de ambas as linhas, exercia a tutela sobre os menores, de um modo especial em casos de orfandade, e sobre as mulheres solteiras. A tradição germânica dava, com efeito, uma importância primordial à família, o que se traduzia na solidariedade entre os seus membros, a quem competia vingar o homicídio e outras ofensas graves a qualquer um deles, no dever de serem cojuradores, isto é, de reforçarem com o seu juramento as declarações da vítima, e na protecção concedida aos órfãos menores, às mulheres solteiras e às viúvas[34].

Vestígios dos costumes germânicos seriam denunciados do mesmo modo pelas práticas relativas ao contrato, como a norma da vicissitudo, segundo a qual não havia contratos gratuitos, nem sequer o do matrimónio, as formas de transmitir mediante actos simbólicos o direito de propriedade, e a limitação das demandas por evicção até à terceira pessoa[35].

No domínio da justiça, diversos conceitos revelariam aspectos característicos da tradição germânica, como a irrelevância da existência ou não de intenção ou de premeditação, para a gravidade de um delito, a maior pena atribuída aos delitos cometidos de noite, a graduação das penas conforme a parte do corpo atingida e o derramamento ou não de sangue. As ofensas da honra, cometidas com palavras ou com obras, eram punidas com penas graduadas conforme a condição do ofendido, maiores para os delitos contra os vizinhos e os casados do que para os delitos contra os forasteiros e os solteiros[36]. Severas advertências procuravam assegurar a paz da casa.

Outro testemunho da sobrevivência das tradições germânicas era o recurso ao juízo de Deus, através do duelo ou das ordálias com água a ferver ou com ferros em brasa[37].

A vingança do sangue era a situação a que ficava exposto aquele que cometia um crime de assassínio ou uma grave ofensa da honra alheia: violação ou rouso, rapto, abandono do cônjuge (especialmente por parte da mulher) e outros ultrajes com acções ou palavras. A família da vítima considerava-se no direito de se vingar do autor do delito, fazendo justiça pelas suas próprias mãos.

Antes de proceder contra o inimigo, o representante da parte ofendida, sob pena de incorrer na situação de perda da paz e de ser considerado como traidor, tinha de proceder ao diffidamentum e à declaração oficial de inimizade, que deviam ser feitos perante o concelho, o que, em geral, acontecia ao domingo. Se o acusado negasse o delito, tinha de lutar com outra pessoa de condição idêntica à sua – era a lide judicial – e, se o resultado se lhe mostrasse favorável, estava reconhecida a sua inocência, o que lhe dava o direito de, ainda no campo da luta, ser saudado pelo acusador. Se este se recusasse a fazê-lo, incorria no estado de inimizade[38]. Se o acusado fosse vencido, era-lhe dado um prazo – em geral, três vezes nove dias – para liquidar a multa que era obrigado a pagar[39]. Mesmo depois do pagamento dessa multa, mantinha-se a inimizade – com as duas consequências a ela inerentes, o desterro e a vingança do sangue – até que a parte ofendida perdoasse ao inimigo, que tinha, caso contrário, um prazo, de três a nove dias, para fugir, findo o qual seria expulso[40].

Quando o criminoso era surpreendido em flagrante, em certas situações – em acto de adultério, a dormir com as filhas ou as irmãs de alguém – podia ser morto imediatamente pelo pai, filhos, irmãos, tios ou primos da vítima até ao terceiro grau[41].

A reconciliação entre as partes, que devia ser feita perante o concelho, expressamente convocado para o efeito, convertia a inimizade em amizade, restabelecendo a paz entre o autor do crime e a família da vítima[42].

A perda da paz tinha consequências muito graves. A paz era entendida como o estar de bem com e na comunidade. Os delitos podiam levar a que o estado de paz se perdesse e isso acontecia quer a nível da comunidade local quer de todo o reino. O que incorria na perda da paz era considerado inimigo público (totius concilii inimicus) e por vezes classificado como traditor e como “aleivoso”. Qualquer membro da comunidade podia matar o que estivesse nesta situação[43].

Os delitos que conduziam à perda da paz eram, por regra, o rapto e a violação, especialmente tratando-se de jovens confiadas ao estuprador ou de parentes que viviam com ele, e o homicídio sem o prévio desafio (diffidamentum) e declaração de inimizade quer após a reconciliação, quer em tempo de trégua, quer depois de a vítima ter apresentado a fideiussoria de salvo.

Pronunciada a sentença que declarava a perda da paz, o visado tinha de abandonar o concelho no prazo de poucas semanas. Outra das consequências da perda da paz podia ser a destruição da casa, por demolição ou por incêndio, e a confiscação dos bens[44].

A penhora extra-judicial consistia em tomar os bens móveis, como meio de garantir o pagamento de uma dívida resultante de um contrato ou de um delito. Apenas se recorria ao juiz quando o penhorado contestava os fundamentos da penhora. Sobre o modo como a penhora devia ser feita, não havia uniformidade. Em certos lugares era vedado fazê-la aos domingos e dias festivos, ou, para respeitar a paz da casa, levá-la a incidir sobre bens guardados no seu interior, enquanto existissem outros que não estivessem nessa situação.

A importância atribuída aos laços familiares fazia com que estivessem sujeitos à penhora os parentes do devedor, quando este não possuísse bens capazes de serem penhorados. Era vulgar a penhora feita aos vizinhos do devedor e mais vulgar a participação dos vizinhos na realização de penhoras aos devedores de outro concelho.

Os imóveis só poderiam ser penhorados em casos excepcionais, quando não houvesse bens móveis susceptíveis de serem penhorados. Razões especiais impediam que certos bens fossem penhorados: os animais empregados na agricultura ou na almocrevaria, o cavalo e as armas do cavaleiro, o leito e os vestidos[45].

Os bens submetidos à penhora não deviam ter valor muito diferente, e nunca ultrapassar o dobro daquele que estava em dívida. Quem procedia à penhora não adquiria logo a propriedade dos bens penhorados, tendo apenas o direito de retenção, e considerava-se responsável se por sua culpa os bens penhorados se deteriorassem, podendo dispor deles apenas, se o devedor não cumprisse as suas obrigações, depois de terminado o prazo, quando este fosse determinado judicialmente[46].

        4. O contributo muçulmano e moçárabe.

Repetidas vezes se tem afirmado, e com verdade, que os muçulmanos não conheceram qualquer tipo de organização que se pudesse assemelhar ao município da Europa ocidental.

O califado dividia-se em kurâs ou províncias governadas por valíes, sob cuja dependência, além de muitos outros funcionários de menor importância, se ocupavam da ordem pública e da administração das cidades o cadi ou juiz, assessorado por um conselho de muftíes ou juristas, o sahib al-madina (zalmedina)[47] ou governador, assistido por vários oficiais subalternos, o sahib al-šurta (zabazorta) ou chefe da polícia, o sahib al-sūq (zabazoque), inspector e juiz do mercado e da vida comercial, vários almušrif (almoxarifes) ou cobradores de impostos e al-muhtasif (almotacés) ou juízes dos pesos e pedidas[48]. Apesar de várias destas funções se repercutirem na organização dos municípios ibéricos, não se encontra nem uma sombra de organização municipal nas cidades árabes da Península[49]. Todos estes funcionários eram nomeados pelo califa, e respondiam perante ele e não perante o povo.

No entanto, encontramos no mundo islâmico anterior à invasão da Península Ibérica alguns traços que, por si mesmos, poderão ter contribuído para dar um timbre especial ao municipalismo ibérico.

Desprovidas de um passado cultural sólido, as tribos submetidas encontraram nos seus dominadores, experimentados a gerir a coexistência de grupos gentílicos autónomos, aqueles que lhes podiam garantir uma existência pacífica sem obrigar os seus membros a renunciarem a uma grande parte dos seus hábitos e crenças religiosas. Os árabes vencedores, com efeito, nunca se interessaram em demasia pela organização urbana, cheia de tarefas repetitivas, pelo que, em troca das receitas fiscais, aceitaram com facilidade que as elites locais, os proprietários da terra, os cobradores de impostos e os diversos quadros administrativos e financeiros mantivessem as suas posições dentro da nova ordem política e social. O próprio urbanismo muçulmano admitia, dentro da cidade, os bairros semi-autónomos, que se tornavam um espaço de mediação entre a autoridade e os cidadãos. Os responsáveis pela manutenção da ordem, embora agindo em nome do príncipe, consultavam os conselhos de notáveis para encontrar as melhores soluções para os problemas que se levantavam. A força da autoridade, al-sultân, não devia ser utilizada senão em casos extremos, na certeza de que a desordem era sempre pior do que a ordem injusta. Preferia-se o compromisso ao rigor.

Cada grupo social ou religioso – tribos, camponeses, sunitas, chitas, cristãos, judeus, estrangeiros residentes integrados ou não – agindo como pessoa moral autónoma, defendia as suas conveniências, por vezes em detrimento dos vizinhos. As autoridades sabiam a importância que havia em pôr estes grupos de acordo quanto aos seus interesses mínimos, de modo a evitar graves perturbações da harmonia social[50]. Por outro lado, a situação das pequenas comunidades voltadas para o seu interior promovia os hábitos de participação dos respectivos membros na resolução dos problemas internos. No seio de um estado centralizado, assistimos assim ao desenvolvimento de redes de solidariedade e de responsabilidade, ao nível das pequenas comunidades locais, muito próximas daquelas que conduzirão à organização municipal. Tais ligações, de índole variada – económica, familiar, de interesses,... – substituíam as inexistentes instituições urbanas e cimentavam a coesão entre os grupos com cujos notáveis o estado negociava a sua autoridade.

Esta organização manteve-se após a reconquista, nas comunidades muçulmanas e judias, que gozaram de um estatuto próprio, especialmente nas cidades do centro e do sul de Portugal, como Lisboa, Almada, Palmela, Alcácer do Sal, Évora, Moura, Faro, Loulé, Silves, Tavira ...

O que sucedia no meio urbano acontecia também no mundo rural, onde um certo abandono das comunidades de camponeses a si mesmas, desde que satisfizessem as suas obrigações tributárias, as conduziu a se organizarem localmente em moldes autogestionários. J.-C. Garcin cita o exemplo de um distrito rural do Al-Andalus oriental, composto por catorze aldeias (kurâ) cujos habitantes, no primeiro quartel do século XII, em momento de insegurança, se refugiaram numa fortaleza (hisn) que lhes pertencia e que, passado o tempo da insegurança, regressaram às suas aldeias e se preocuparam com a recuperação da velha mesquita ou a construção de uma nova, para aí efectuarem as suas orações em comum[51].

Diversos documentos do século XII e XIII atestam a existência de fortes comunidades rurais ou djamâ‘a/s (aljamas no vocabulário dos reinos cristãos) dirigidas pelos seus “anciãos” ou shuyûkh[52].

São as mesmas comunidades que negoceiam com o príncipe e lhe entregam os castelos que lhes pertencem e que centralizam os respectivos territórios. Se as fortificações mais importantes estão confiadas a um oficial do emir, o kâ’îd (alcaide nos textos cristãos), os castelos de menor envergadura continuam nas mãos da comunidade rural. Estas comunidades rurais sobrevivem à reconquista em várias regiões da Península[53].

Enquanto as comunas de mouros forros de Lisboa, Almada, Palmela, Alcácer do Sal, Évora, Moura, Faro, Loulé, Silves, Tavira, e outras, reproduzem o estatuto das comunidades diferenciadas no interior da cidade islâmica, a documentação relativa a algumas localidades portuguesas, especialmente na área de Ribacôa, conserva vestígios da organização que, sob o domínio muçulmano, caracterizava o mundo rural, com uma autonomia mitigada das aldeias, em relação a certos problemas, e um conselho de notáveis – os seis, correspondentes aos shuyûkh, anciãos ou notáveis que representavam a comunidade na sociedade muçulmana[54], cuja designação, pelo menos inicialmente, nada terá a ver com aspectos numéricos – os quais intervêm na resolução de vários problemas da vida pública[55].

O Tratado de Ibn Abdun fornece-nos uma colorida imagem da organização de uma cidade muçulmana medieval no século XII[56]. No topo da hierarquia encontra-se o príncipe, cujo procedimento discricionário os seus conselheiros poderão influenciar, se para tal dispuserem de sabedoria. O cadi ou juiz é a figura de maior relevo na administração corrente, devendo providenciar no sentido de que os avaliadores de impostos, que Ibn Abdun considera a escória da populaça, se contenham nos limites das suas funções. Com eles colaboram, no mundo rural, os chefes das aldeias.

Ibn Abdun recomenda que os magistrados sejam recrutados entre os andaluzes e não entre os almorávidas, porque os primeiros conhecem melhor os assuntos que interessam à população. Na sua actuação, o juiz serve-se dos juristas (alfaquis), que, neste caso, em concreto, “não deverão ser mais de quatro, dois na cúria do juiz e dois na mesquita maior, cada dia e por turnos”. Aí devem julgar e não nas sua casas, para afastar as tentações da indolência ou da corrupção. O cadi examinará as suas propostas, tendo competência para as aprovar ou não. Aplica-se-lhe também o que Ibn Abdun diz acerca do juiz secundário, cuja actividade essencial deve consistir em reconciliar as partes e que “deve ser pessoa de bem e de bons costumes, rico, sábio, experiente nos procedimentos judiciais, íntegro, incorruptível, imparcial, dedicado a dar sentenças justas e equitativas”.

Os alvazis (ou alguazis) colaboram com o cadi na governação da cidade. No caso concreto de Sevilha, também não deverão ser mais do que dez, a saber, “quatro berberes negros para os assuntos dos almorávidas ou outras personagens das que velam o rosto, e os demais andaluzes, que são mais de fiar e mais temidos”. Além disso, “uns e outros terão de ser homens de confiança, entrados em anos, conhecidos como pessoas de bem e de boa conduta”[57].

O juiz aparece também como representante e defensor do povo, a usufruir de um poder que o coloca acima dos ministros do governo: “deve poder convocar a todo o momento o vizir do governo (...), submetê-lo a vigilância e impor-lhe respeito, a fim de que não proponha ao chefe do governo (grão-vizir) qualquer medida desfavorável aos muçulmanos: “o juiz deliberará com ele sobre os negócios em curso, antes de falar deles ao chefe do governo, e, se o chefe do governo lhe coloca um assunto, deve o vizir informar o juiz para que este lhe dê a sua opinião”[58].

O juiz propõe ao príncipe o nome do almotacé, que “há de ser homem de bons costumes, honrado, piedoso, sábio, rico, nobre, perito, experimentado, inteligente e incapaz de parcialidade ou corrupção”. Com efeito, “o cargo de almotacé é como irmão do de juiz” e, portanto, convém que seja escolhido entre pessoas de condição semelhante, pois “o almotacé é a língua, o camarista, o vizir e o lugar-tenente do juiz”, de tal modo que, “quando o juiz não pode fazê-lo, é ele quem julga em seu lugar os assuntos que incumbem a ele e ao seu cargo”. Na prática “o almotacé substitui o juiz em muitos assuntos que este deveria em princípio examinar e evita-lhe fadigas”. Do bom desempenho das funções do almotacé dependem em muito a harmonia e a paz social: “se este cargo é exercido com todo o rigor, redundará em benefícios para a sociedade e a população em geral, porque entre as suas atribuições figuram o fazer observar as prescrições religiosas, os usos fixados pela tradição e o vigiar a actividade dos obreiros e artesãos assim como os produtos de que o homem necessita para viver”.

       5. Os foros de francos.

Merece atenção o papel dos imigrantes estrangeiros nas origens do municipalismo português, quer através dos comerciantes que se instalaram em diversos burgos, quer através de grupos organizados que vieram do centro da Europa, a povoar algumas das terras recentemente conquistadas.

Data de 1861 a polémica que se levantou na Espanha, originada por A. Helfferich e G. de Clermont que, num opúsculo então publicado[59], terão exagerado, com alguma leviandade, a influência atribuída aos franceses nas origens do municipalismo peninsular. Tomás Muñoz y Romero atacou a confusão por eles feita entre foros francos e foros de francos e negou a existência de foros francos na Península, onde não haveria foros importados do estrangeiro, isto é da França (foros francos), mas foros concedidos a estrangeiros, migrados da França para a Espanha e para Portugal (foros de francos).

Regressando ao tema, a propósito do nono centenário do foral de Logroño, Jesús Lalinde Abadia[60] observou, em primeiro lugar, que franco não seria o mesmo que francês, no sentido em que hoje o entendemos. A designação de franco teria um sentido genérico e aplicar-se-ia a todos os “estrangeiros”, isto é, provenientes de territórios exteriores à Península Ibérica, mas só uma parte deles seria de etnia franca. Depressa, no entanto, se terá passado de um significado étnico para uma acepção de índole social, em que franco era o equivalente de burguês ou ruano, isto é, o que vivia nos burgos. Entendido o termo neste último sentido, com a sua condição de francos estariam relacionadas as liberdades ou franquias de que foram paladinos e que muitos documentos lhes reconheceram. Estes documentos seriam principalmente os chamados foros de francos, podendo considerar-se como tais, entre muitos outros, os de Jaca e de Logroño e ainda os que foram concedidos a uma parte dos habitantes (os francos) de Toledo, distinguindo-os dos moçárabes, dos judeus e dos mouros. No entanto, se na linha das franquias e liberdades, de que os forais que lhes respeitam foram defensores, se enquadram a isenção da saionia, do fossado, da anúduva, da maneria e da carreagem, verifica-se que, em desacordo com essa doutrina, os forais de Logroño e de Jaca, e outros que os imitam, ainda contém sequelas de tradições bárbaras, como o duelo, as ordálias e a responsabilidade penal, o que não ajuda a encontrar uma solução definitiva[61].

Em Portugal, podem enquadrar-se no conjunto de forais de francos entendidos nesta última acepção, os forais concedidos aos nossos burgos, que têm como paradigmas principais os de Guimarães e Constantim: neles se concedem amplas isenções e liberdades aos burgueses que se tinham instalado ou se viessem a instalar nas respectivas localidades e aí estabelecessem a base da sua actividade.

No entanto, foram concedidos forais de índole específica, que nada têm a ver com os dos burgos, a comunidades de migrantes originários de território francês e instaladas em Vila Verde dos Francos (Alenquer)[62], Lourinhã[63] e Montalvo de Sor[64]. Consideravam-se também como francígenas os “flamengos” de Vila Franca, a que hoje se dá o nome de Azambuja[65]. Antes que a designação étnica “francos” desse origem ao nome do país sobre o qual vieram a estabelecer o seu domínio, a França, os habitantes desse território, que antes se chamava Gália, eram designados como galos ou gálicos (e, modernamente, gauleses, adaptando o vocábulo gaulois ou, no plural, gauloises); no século XII, ainda se distinguiam gálicos e francos, como o demonstra o facto de entre nós se terem estabelecido duas comunidades com tais origens, recebendo cada uma a sua carta de foro, apesar de vizinhas: a Atouguia dos Francos[66] e a Atouguia dos Gálicos (Gallecorum)[67]. Os costumes que os respectivos forais e especialmente os da Lourinhã registam são bem mais rudes e bárbaros[68] que os dos “francos” instalados nos burgos do norte. É que, enquanto aqueles diziam respeito a levas de agricultores directamente migrados das suas terras de origem, os “burgueses”, na sua maioria, seriam comerciantes e mesteirais francos da segunda ou terceira geração ou simplesmente a eles assimilados pelas actividades a que se dedicavam.

        6. A luta pela liberdade.

Reyna Pastor chamou a atenção para a existência de três tipos de colonização no noroeste peninsular, a partir de finais do século IX[69]: uma feita directamente pelo Rei, outra, com a sua prévia autorização ou com o seu posterior reconhecimento, pelos nobres e eclesiásticos, e outra, espontânea, realizada por gente do povo, que, embora designada também, por vezes, como presúria, consistia num simples assentamento de pessoas, que desse modo se apropriavam das terras, para as cultivar. A procedência destes colonos era diversa, estendendo-se a várias regiões: vascos, cantabros, asturianos, galegos e moçárabes vindos do Andaluz, cuja origem muitas vezes ficou registada na própria toponímia. Aos que vinham de longe, somavam-se os que provinham de aldeias próximas e uma parte deles relacionava-se também por laços de parentesco.

No momento em que os documentos revelam a existência destas comunidades, isto é, a partir do século X, há uma certa diversificação no interior de algumas delas: há um grupo social que se designa como o dos “maiores” e outro como o dos “menores”. Esta diferenciação não se encontra, porém, com frequência, nas comunidades mais pequenas[70]. Em várias destas aldeias, os habitantes aparecem organizados num concelho, que se reúne para tomar decisões e assumir compromissos.

A comunidade considerava como sua pertença um território que se compunha de áreas diversificadas: as terras em que assentava a “vila” ou aldeia propriamente dita, com as casas, os pátios e os respectivos quintais, as terras de cultivo e as zonas de pasto ou montado. Não há informações sobre o modo como eram distribuídas as terras de cultivo, se por sorteio, se por acordo entre os interessados. A posse individual dos espaços cultivados coexistia com a posse comunitária de outros espaços, designadamente das reservas de água, dos montados, destinados à pastagem dos gados, ao aprovisionamento de lenha e de madeira e ao corte de mato para os currais[71].

Enquanto os instrumentos de produção mais simples – como os sachos, as foices e os arados – eram de propriedade familiar, outros, mais complexos e custosos, eram em geral construídos e fruídos pela comunidade, como sucedia com as levadas, os moinhos[72] e os fornos.

Com a intensificação do processo de povoamento, algumas aldeias deram origem a outras, com famílias que se foram instalar em localidades próximas ou, por vezes, mais distantes[73].

Os habitantes destas aldeias, especialmente em ocasiões de conflito com outros poderes, delegavam em alguns dos seus membros a defesa dos seus direitos, o que naturalmente supõe a existência de uma consciência comunitária. A expressão concilio aparece com frequência para designar a sua reunião em assembleia.

A sua força ajudou estes grupos a sobreviverem, contra as tentativas de absorção nos domínios senhoriais e terá contribuído para que muitos forais tivessem surgido como resposta às pressões do feudalismo.[74].

O rei e os seus agentes, os condes, reconheceram tais comunidades como entidades dotadas de personalidade jurídica, pois tratavam com elas, ou com os seus representantes, de vários assuntos: processos judiciais, acordos, limites territoriais, oficialização de direitos.

        7. Em síntese: municípios e aldeias.

Nas últimas décadas, um número razoável de historiadores considerou que, de facto, não existiu uma verdadeira continuidade entre a cidade antiga e a cidade tardo medieval, no seu espírito e nas suas funções, mesmo quando ocuparam o mesmo espaço e quando este não tinha sido inteiramente abandonado durante o lapso de tempo que transcorreu entre uma e outra. Não podemos cair, no entanto, no extremo oposto e negar toda a influência do passado romano, que, embora esbatida, sob muitos aspectos, se continuou a fazer sentir pelos tempos fora, repercutindo-se, a níveis e em aspectos diversos, na organização e nas leis do reino visigótico e no próprio mundo muçulmano peninsular, especialmente no que se refere à ligação entre os cidadãos e o espaço que habitavam e à sua mútua solidariedade e responsabilidade dentro desse território.

A teoria de Eduardo de Hinojosa, por seu lado, é uma construção ideal em que se reúne um acerbo de elementos que de facto nunca tiveram vigência como sistema jurídico em qualquer território concreto. Corresponde a um conjunto de práticas que se encontram referidas em alguns dos nossos forais mais antigos, umas adoptadas, outras combatidas, e que não seguem, antes pelo contrário se opõem à tradição jurídica romana e visigótica. Nada, porém, nos concede o direito de considerar que tais costumes se deviam em exclusivo aos povos germânicos que invadiram a Península Ibérica no século V, sendo provável que muitos correspondessem a tradições pré-romanas autóctones que se conservaram no território.

A instituição municipal em si mesma também nada tem a ver com a organização da sociedade muçulmana, embora esta tenha fornecido alguns contributos não menosprezáveis, especialmente nos primeiros tempos de vida dos concelhos meridionais. Esse contributo não se limitou à linguística – o alcaide, o alvazil, os alcaldes, o almotacé, o almoxarife – mas estendeu-se à organização judicial e administrativa no interior das próprias comunidades, destacando-se especialmente o que diz respeito ao papel dos alcaldes no governo dos municípios que receberam um foral segundo o paradigma de Numão, ou dos alvazis, nos centros urbanos do centro e do sul, dos almotacés na regulação do mercado e da actividade económica dos centros urbanos, e dos conselhos de anciãos ou de notáveis (os seis), que velavam pelos interesses das pequenas comunidades, em nome das quais deviam exercer uma atenta vigilância sobre o desempenho dos executivos municipais.

Embora o município medieval não tenha nascido directamente do município romano, nem das formas de organização pré-romana ou das instituições germânicas e muito menos da sociedade muçulmana, nem seja uma criação inteiramente original, gerada no seio do reino astur-leonês, não se pode negar a influência que deve ser atribuída aos sedimentos culturais de várias proveniências, que se foram acumulando com a passagem do tempo e que então encontraram o clima propício à geração de uma nova realidade.

Muitas das tradições a que os estudiosos da segunda metade do século XIX e da primeira metade do século XX atribuíram uma procedência germânica, colocando as suas origens no mundo visigótico anterior à sua conversão à cultura romana, terão uma origem ancestral, bem mais longínqua, pré-romana, pois eram comuns a outros povos primitivos, especialmente àqueles em que predominava uma organização tribal, em cujo seio os laços de solidariedade se baseavam no parentesco, em grau mais próximo ou mais remoto. O indivíduo existia enquadrado na família propriamente dita e, para além dela, na família alargada, constituída por aqueles que se considerava terem um passado gentílico comum. Numa sociedade organizada a partir desta base, os grandes problemas resolviam-se em assembleias de família ou de tribo e era ao nível da família ou da tribo que se tratava das relações dos indivíduos com as outras comunidades, designadamente no plano da justiça. Desse enquadramento derivariam instituições como a inimizade, a perda da paz, a vingança do sangue, a penhora extra-judicial (na verdade, a penhora em que não intervinham órgãos judiciais exteriores à gens ou à família), a dependência dos filhos e das mulheres em relação aos pais ou à família, no caso dos órfãos.

A República Romana reconheceu a existência das tribos e das famílias e até assentou nelas a organização de algumas das suas instituições representativas no domínio civil e militar e manteve a sua memória na própria onomástica. A grande inovação romana consistiu em retirar às organizações gentílicas o exercício directo de qualquer forma de poder público, transferindo-o para os órgãos directa ou indirectamente resultantes das eleições em que os membros de todas as tribos participavam.

A quebra de continuidade entre o mundo romano e o mundo da reconquista não foi devida a um simples corte na sequência factual, isto é, à queda da monarquia visigótica, que libertaria o seu povo do constrangimento de uma legislação decalcada da romana, dando-lhe a possibilidade de recuperar os antigos costumes, aos mesmo tempo que uma boa parte dos seus súbditos caía sob a alçada do regime muçulmano: se este permitiu que os cristãos, desde que cumprissem as suas obrigações tributárias e se contivessem dentro de certos limites, continuassem a praticar a sua religião e a seguir os seus costumes, não foram as tradições germânicas as preferidas, antes pelo contrário, foi entre as populações moçárabes, submetidas ao jugo muçulmano, que por mais tempo se manteve em vigência o Liber Judicum.

Nem o ermamento – cuja dimensão extrema foi, desde há muito, posta em causa – fornece uma explicação suficiente para esse hiato. A documentação revela que a memória e porventura uma parte da realidade física de várias das antigas cidades das margens do Douro ainda se mantinham vivas nos séculos X e XI e só depois da presúria foram sepultadas nas cinzas do esquecimento.

A grande transformação não foi propriamente a das estruturas físicas – os habitats, as pessoas... – mas a mudança do espírito que animava os centros urbanos, e que estava em relação com a natureza e as funções próprias da cidade no mundo antigo e no mundo posterior à reconquista. Na cidade antiga predominavam as funções administrativas e militares, a que se acrescentavam as funções religiosas. A partir do século X, atingindo o apogeu entre 1150 e 1330, desenvolveu-se na Europa um novo modelo urbano, caracterizado pela primazia das funções económicas[75].

Vemo-nos assim estimulados a reconhecer nos concelhos medievais um produto que recolhe de um modo original vários contributos – pré-romano, romano, germânico, muçulmano, moçárabe – sem contudo se identificar ou confundir exclusivamente com alguns deles. Com tais raízes, as circunstâncias históricas dos vários protagonistas e a necessidade de garantir a sobrevivência e a liberdade das comunidades e de resolver de um modo criativo os problemas com que deparavam, de par com os múltiplos contactos e influências que a reanimação dos velhos caminhos e a circulação das pessoas favoreciam, especialmente a partir da dobragem do milénio, dariam origem a essa instituição que se havia de tornar um elemento fulcral na organização do Estado.

A evolução dos municípios medievais, nas suas origens, não seguiu, todavia, um percurso linear, como se poderia imaginar se tivessem um único passado, para mais quando, nessa hipótese, o decurso dos séculos poderia ter permitido uma gradual decantação de elementos espúrios. Resulta de uma pletora de heranças e da própria índole social e comunitária do ser humano, que, em peculiares circunstâncias históricas, encontrou o clima propício ao florescimento dessa nova realidade.

*   *   *

Os municípios medievais surgiram, em boa medida, como afirmação de autonomia contra forças externas que se opunham à liberdade dos cidadãos, e entre essas forças contavam-se os poderios leigos e eclesiásticos. Mas, para além disso, resultaram da necessidade que os munícipes sentiram de juntar as suas energias para alcançar esses e outros objectivos que individualmente lhes seriam inacessíveis. O primeiro passo foi dado quando um grupo de pessoas fixadas num determinado espaço, algumas delas possivelmente unidas por laços de parentesco mas independentemente deles, adquiriu a consciência de constituir uma comunidade, em cujo destino os seus membros se sentiram solidários, ao reunirem-se para tratar de interesses comuns. Em vários casos, essas reuniões poderiam inspirar-se nas antigas assembleias de família, mas a realidade já era outra: enquanto a assembleia ou conselho de família congregava os que estavam unidos por laços de sangue, sem carecer de referência a um espaço concreto, a assembleia de vila ou de aldeia reunia aqueles que, independentemente dos laços familiares, estavam ligados pelo espaço concreto onde habitavam. Nascia então o novo conselho, que não era já o conselho de família mas o conselho/concelho de aldeia ou de vila. Para que estes concelhos se afirmassem, não era necessário um diploma régio ou senhorial, embora em muitos casos ele viesse a ser outorgado. Conhecem-se vários exemplos de aldeias em que a antiga organização chegou aos nossos dias, tendo algumas delas merecido a atenção dos antropólogos que as designaram como “aldeias comunitárias”[76].

Alguns municípios tiveram a sua origem em simples aldeias, com uma autonomia bastante limitada: para resolver os assuntos mais graves, especialmente em questões de justiça, tinham de recorrer a instâncias superiores, designadamente aos órgãos da justiça régia ou condal. O município propriamente dito começou a existir quando a comunidade dispôs da faculdade de escolher o seu juiz, que presidia ao concelho e assumia a responsabilidade do julgamento dos crimes maiores, solitariamente ou como presidente do grupo de responsáveis eleito pela comunidade para tratar dos assuntos da justiça e dos outros aspectos do governo local.

Nos primeiros tempos, nem sempre era clara a distinção entre a aldeia e o município, especialmente em áreas acentuadamente rurais, mas o município veio a distinguir-se da aldeia pela vastidão do seu alfoz, de que resultava uma abundância maior de recursos para cumprir as suas funções, como as fortificações, o arranjo dos caminhos e das fontes, e pela hierarquização do território, que incluía várias aldeias, colocadas sob a dependência da “vila”, principalmente em questões de justiça. Na aldeia havia normalmente um mordomo que se encarregava da cobrança dos foros e tributos e das coimas aplicadas aos delitos mais leves, mas para os feitos de índole criminal era necessário recorrer à justiça do município ou à justiça régia.

Se de início os pequenos concelhos eram globalmente designados como “vilas”, este nome viria a ser reservado à sede do município em que se integravam as várias aldeias. Para entender o processo, é necessário compreender a evolução semântica do vocábulo. A villa constituía, sob o domínio romano, e terá continuado a constituir no período suevo e visigótico, uma ampla exploração fundiária, de que faziam parte as terras aptas para as várias culturas e o casario necessário para a habitação do senhor, ou do seu villicus ou feitor (factor), e do pessoal que trabalhava na exploração, e para os equipamentos necessários, como os lagares, as adegas, os armazéns e os estábulos.

No século IX, enquanto ia progredindo a presúria do território, ainda encontramos referências a vilas que, em doações, vendas e permutas, são tratadas globalmente como um todo, mas a partir daí assistimos à multiplicação das referências à diversidade de casais em que essas vilas se fragmentaram, embora se mantenha a memória da vila a que anteriormente pertenceram. Essa evolução dever-se-á a várias causas, entre as quais se destacará a impossibilidade de os seus proprietários gerirem directamente, ou por intermédio de feitores (factores) devidamente capacitados, as extensas explorações agrícolas, optando pela sua divisão em unidades de exploração familiar, os casais – pequenas explorações agrícolas, formadas por terras não necessariamente contíguas, capazes de alimentar uma família e de produzir os excedentes suficientes para pagar as rendas e outros direitos. O casal (que no mundo carolíngio se chamava manso, de mansio, casa de habitação), além da casa ou pardieiro destinado à habitação, incluía terras com aptidões diversificadas e complementares, que tornavam viável a sua exploração: os campos destinados à produção de cereais, as vinhas, por vezes o pomar, a mata para a recolha de lenha e de mato destinado aos currais. As casas de habitação de vários casais podiam estar dispersas ou juntas num pequeno aglomerado.

Umas resultantes da transformação de antigas villas romanas que atravessaram o período suevo e visigótico, outras resultantes da iniciativa dos presores, senhores leigos ou eclesiásticos, ou dos simples cultivadores, as vilas a que se referem muitos documentos dos séculos XI, XII e XIII englobavam vários casais independentes.

No correr do tempo, com a hierarquização do espaço, na sua maior parte, essas vilas passarão a ser designadas como aldeias ou como freguesias, ficando a designação de vila reservada ao aglomerado populacional que presidia a um conjunto de aldeias, ou a um aglomerado urbano com um número de habitações superior ao que era normalmente o das aldeias, como sucedeu, por exemplo, com Ponte de Lima, em cujo foral D. Teresa, já em 1125, declarava “placuit mihi ut faciam villam supranominato loco Ponte”[77]. Em geral, as sedes dos municípios são designadas como vilas, com excepção, e nem sempre, das sedes episcopais, referidas como cidades: é este o caso de Braga, Porto, Lamego, Viseu, Coimbra, Idanha e a Guarda sua sucedânea, Lisboa, Évora e Silves[78].

O vocábulo aldeia deriva da língua árabe (day’a  ou al- day’a , as casas), mas foi transposto para o norte de Portugal com um significado algo diferente, tornando-se equivalente ao que, em árabe, era designado com o vocábulo qarya ou al-qarya. A primeira referência explícita às aldeias, com este nome, dando-lhe um sentido diferente do de vila, encontramo-la na carta de 1253 relativa aos “hominis de aldeis et de terminis de Bragancia de extra villam de Bragancia”[79].

Quando o espaço da vila acabou por coincidir com o da paróquia religiosa, recebeu o nome de freguesia (filii ecclesiae > fregueses). Noutros casos, a paróquia ou freguesia englobava diversas vilas. Na segunda metade do século XIII, por exemplo, a paróquia de S. Salvador de Jugal, no julgado de Aguiar de Pena, incluía as vilas de Luzedo, Cidadela, Guilhado, Condado, Calvos e Froengo, do mesmo modo que na paróquia de S. Martinho de Bornes se localizavam as vilas de Soveroso, Barvadães, Eris, Bornes, Larinato, Rebordochão, Vila Meã, Tinhela de Susã e Valoira[80].

 


[1] Sobre a participação dos cidadãos romanos na vida pública, cf. Francesco Amarelli, Francesco Schiavone ed altri, Politica et partecipazione nelle città dell’Impero Romano. Roma, Edizioni L’Erma, 2005.

[2] Jean-Pierre Martin, As Províncias Romanas da Europa Ocidental e Central de 31 a. C. a 235 d. C., trad., Lisboa, Europa-América, 1999, p. 192.

[3] Jean-Pierre Martin, l. c., p. 192.

[4] Patrick le Roux, Les Villes de Statut Municipal en Lusitaine Romaine, em Centre National de la Recherche Scientifique, Les Villes de Lusitaine Romaine, Paris, 1990, p. 35-49. Patrick le Roux chama a atenção para as diferenças que se verificavam em matéria de direito público entre um município da Itália e um município flaviano da Bética. Para aceder à categoria de município era necessária uma lei fundadora muito clara, havendo um conjunto de condições indispensáveis: a existência de um núcleo suficientemente grande de cidadãos romanos, recursos fiscais ou financeiros que permitissem a administração autónoma da nova comunidade e do seu território e interesse da própria comunidade em adoptar esse estatuto de autonomia.

[5] Patrick le Roux, l. c., p. 45.

[6] A este propósito pode ver-se também Patrick le Roux, La Galice Romaine, Paris, Diffusion de Boccard, 1981, p. 60 e ss.; Antonio Rodríguez Colmenero, Aquae Flaviae. I Fontes epigráficas da Gallaecia meridional interior, Chaves, Câmara Municipal, 1997, p. 13 e ss.

[7] Homem livre que não usufruía do direito da cidade romana nem do direito latino mas não era inimigo público.

[8] Cf. supra, cap. I, subtítulo 5.1.

[9] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, Ruina y Extinción del Municipio Romano en España e Instituciones que le reemplazan. Buenos Aires, Facultad de Filosofía y Letras, 1943, p. 15.

[10] Após a unificação jurídica, os reis visigodos promoveram a codificação do direito, para aplicação a todos os seus súbditos, dando origem ao Codex Euricianus (Eurico: 469-481), à Lex Romana Visigothorum ou Breviarium Alarici (506), ao Codex Euricianus Revisus ou Breviarium Aniani (597-586), e, finalmente, com Recesvindo, ao Código Visigótico, de 654, também conhecido como Liber Judicum, Forum Judicum, Liber Judiciorum, revisto, por ordem do Rei Ervígio, em 681, e objecto de adendas posteriores, na chamada forma vulgata. O Código Visigótico foi o que vigorou mais tempo, sendo um dos mais notáveis monumentos jurídicos da Idade Média e de sempre. É citado por diversos textos portugueses do séc. XII, incluindo alguns forais, que o designam como Liber Judicum, Liber, Lex Gotorum, etc.

[11] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 19.

[12] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 19.

[13] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 52.

[14] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 83.

[15] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 86.

[16] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 86-87.

[17] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 93-94.

[18] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 86.

[19] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 109.

[20] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 112.

[21] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 114.

[22] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 122.

[23] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 123.

[24] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 126.

[25] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 126.

[26] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 129.

[27] Claudio Sánchez‑Albornoz, Repoblación del Reino Astur Leonês. Proceso, Dinámica y Proyecciones, em “Cuadernos de Historia de España”, 53-54 (1971), p. 236-459, e republicado em Viejos y Nuevos Estudios sobre las Instituciones Medievales Españolas, Tomo II, Madrid, Espasa-Calpe, 1976, p. 579-790. Citamos esta edição.

[28] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 678-684.

[29] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 693.

[30] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 694.

[31] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 699.

[32] Claudio Sánchez‑Albornoz y Menduiña, l. c., p. 753.

[33] Eduardo de Hinojosa, El Elemento Germânico en el Derecho Español. Madrid, Junta para Ampliación de Estudios y Investigaciones Cientificas, 1915.

[34] Idem, ibidem, p. 18-19.

[35] Idem, ibidem, p. 24-25.

[36] Idem, ibidem, p. 25-27.

[37] Idem, ibidem, p. 28-29.

[38] Idem, ibidem, p. 35-37.

[39] Idem, ibidem, p. 53.

[40] Idem, ibidem, p. 57.

[41] Idem, ibidem, p. 58-63.

[42] Idem, ibidem, p. 65.

[43] Idem, ibidem, p. 70-71.

[44] Idem, ibidem, p. 77-78.

[45] Idem, ibidem, p. 97.

[46] Idem, ibidem, p. 98.

[47] Entre parêntesis, coloca-se a forma com que os vocábulos aparecem transcritos nos textos cristãos da época.

[48] E. Lévi-Provençal, L’Espagne musulmane au X.ème siècle, Institutions et vie sociale, Paris, Larousse, 1932, p. 79 a 114; E. Lévi-Provençal, España Musulmana, em Historia de España dirigida por R. Menendez Pidal, tomo V, 6.ª ed., Madrid, Espasa-Calpe, 1990, p. 67-91; María Jesús Vigueira Molíns et alii, Los Reinos de Taifas. Al-Andalus en el siglo XI, em Historia de España dirigida por R. Menendez Pidal, tomo VIII, Madrid, Espasa-Calpe, 1994, p. 163-190.

[49] Sobre o problema da organização da sociedade muçulmana na Península, cf. Pierre Guichard, El Problema de la existencia de estructuras de tipo “feudal” en la Sociedade de Al-Andalus (el ejemplo de la región valenciana), em Pierre Bonassie, Tomas N. Bisson, Reyna Pastor, Pierre Guichard y otros, Estructuras feudales y feudalismo en el mundo mediterraneo. Barcelona, Editorial Critica, 1984, p. 117-138. Sobre as relações entre os cidadãos na cidade muçulmana, é oportuna a leitura de Christine Mazzoli-Guintard, Vivre à Cordoue au Moyen Âge. Solidarités citadines en terre d’Islam aux Xe-XIe siècles, Presses Universitaires de Rennes, 2003.

[50] Cf. Th. Bianquis, La gestion politique de l’espace e des hommes, em J.-C. Garcin et alii, États, Sociétés et Cultures du Monde Musulman Médiéval (X.e-XV.e siècle), tome 3, Paris, Presses Universitaires de France, 2000., p. 9-12.

[51] J.-C. Garcin, Les Communautés de base sedentaires, em J.-C. Garcin et alii, États, Sociétés et Cultures du Monde Musulman Médiéval (X.e-XV.e siècle), tome 3, Paris, Presses Universitaires de France, 2000, p. 61.

[52] J.-C. Garcin, l. c., p. 62.

[53] J.-C. Garcin, l. c., p. 62.

[54] J.-C. Garcin, l. c., p. 62.

[55] A designação de “seis” ou “sex” encontra-se nos forais extensos de Ribacoa, sem que se especifique o número dos componentes do grupo. Na tradição comunitária de Vilarinho das Furnas, há algumas décadas submergida por uma albufeira, o concelho de aldeia designava-se como Os Seis, porque efectivamente esse era o número dos seus membros. Cf.  Jorge Dias, Vilarinho da Furna. Uma aldeia comunitária, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda [reedição], 1981, p. 87.

[56] Évariste Lévi-Provençal, Séville musulmane au debut du XII.ème siècle. Le traité d’Ibn ‘Abdun sur la vie et le corps de métiers Institutions et vie sociale. Nouv. Ed., Paris, Maisonneuve e Larose, 2001. A partir da versão castelhana, Sevilla a Comienzos del Siglo XII, Madrid, Moneda y Credito, 1948, traduzido parcialmente por António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe, vol. III, Lisboa, Seara Nova, 1973, p. p. 215-243.

[57] António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe, vol. III, Lisboa, Seara Nova, 1973, p. p. 223.

[58] António Borges Coelho, l. c., p. 227-228.

[59] A. Helfferich, G. de Clermont, Fueros francos. Les Communes françaises en Espagne et en Portugal, Berlim, 1861.

[60] Jesús Lalinde Abadia, La foralidad de francos, em Actas de la Reunión Científica “El Fuero de Logroño e su época”, Ayuntamento de Logroño, 1996, p. 23-40.

[61] Jesús Lalinde Abadia, l. c., p.31. Sobre esta temática, mais extensamente, cf. Manuel J. Peláez, El elemento germánico y franco en el Fuero de Logroño de 1095, em Actas de la Reunión Científica “El Fuero de Logroño y su época”, Ayuntamento de Logroño, 1996, p. 257-304.

[62] T.T., F. A., m. 12, n.º 3, fl. 32; F.A.S.C., fl. 20; Gav. 3, m. 11, n.º 6 (em conf. orig. de Af. IV, Lisboa, 8-VI-1338).

[63] T.T., Gav. 15, m. 9, n.º 22; Bens dos Próprios dos Reis e Rainhas, I, fl. 45 v.º; Forais Velhos de Leitura Nova, fl. 16. Publicado em P.M.H.-L.C., p. 447-450.

[64] T.T., Corpo Cronológico, Parte I, m. 1. n.º 3; Doações de D. Dinis, Liv. 5, fl. 52. Publicado em D.D.S., p. 180-181.

[65] T.T., Forais Antigos, m. 12, n.º 3, fl. 32; Gav. 3, m. 11, n.º 6; Forais Antigos de Santa Cruz, fl. 20; Bens dos Próprios dos Reis e Rainhas, Liv. I, fl. 48; Forais Velhos de Leitura Nova, fl. 9.

[66] T.T., Forais Antigos, m. 12, n.º 3, fl. 32 v.o; Forais Antigos de Santa Cruz, fl. 20 v.o; C.R., S.ª Cruz de Coimbra, Doc. Régios, m. 1, n.º 31. Publicado em P.M.H.-L.C., p. 450-451, e em D.D.S., p. 138-139.

[67] T.T., Forais Antigos, m. 12, n.º 3, fl. 33; Forais Antigos de Santa Cruz, fl. 21. Publicado em P.M.H.-L.C., p. 452-453, e em D.D.S., p. 139-141.

[68] Cf. António Matos Reis, Origens dos Municípios Portugueses, Lisboa, Livros Horizonte, 1991, p. 269-278 ou, na 2.ª ed., 2002, p. 213-220.

[69] Reyna Pastor, Sobre la articulación de las formaciones económico-sociales: comunidade de aldea y señorios en el norte de la Península Iberica (siglos X-XIII), em Pierre Bonassie, Tomas N. Bisson, Reyna Pastor, Pierre Guichard y otros, Estructuras feudales y feudalismo en el mundo mediterráneo. Barcelona, Editorial Critica, 1984, p. 92 e ss.

[70] Reyna Pastor, l. c., p. 98.

[71] Reyna Pastor, l. c., p. 103.

[72] Reyna Pastor, l. c., p. 106.

[73] Reyna Pastor, l. c., p. 107.

[74] Reyna Pastor de Togneri, Resistencias y luchas campesinas en la época del crescimiento e consolidación de la formación feudal. Castilla y Lérida, siglos X-XIII. Madrid, Siglo Veintiuno, 1980; Idem, Sobre la articulación de las formaciones económico-sociales: comunidades de aldea y señorios en el norte de la Península Ibérica. Em Estructuras feudales y feudalismo en el mundo mediterráneo. Barcelona, Editorial Critica, 1984, p. 92-115.

[75] Cf. André Chédeville, De la citè à la ville, e Jacques Le Goff, L’apogée de la France urbaine médievale, em La ville médiévale, des Carolingiens à la Renaissance, em “Histoire de la France urbaine, tome 2, La ville médiévale”. Paris, Seuil, 1992, p. 29-181e 183-405.

[76] Citem-se, como exemplos, Jorge Dias, Vilarinho da Furna. Uma aldeia comunitária. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda [reedição], 1981 (1.ª ed., 1948); Idem, Rio de Onor. Comunitarismo Agro-Pastoril. 2.º edição, Lisboa, Editorial Presença, 1981 (1.ª ed., 1953); João Amorim Machado Cruz, Regime Comunitário Pastoril na Serra Amarela (Ermida – Ponte da Barca), em Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol. XXI, Porto, Instituto de Antropologia “Dr. Mendes Corrêa”, 1969, p. 215-229.

[77] T.T., F.A., m. 9, n.º 4; F.A., m. 12, n.º 3, fl. 52-53; F.V., fl. 76; Gav. 15, m. 5, n.º 3; Gav. 18, m. 3, n.º 27; F.S.C., fl. 1 (adenda inicial).

[78] Além das sedes episcopais, essa designação é dada a Bragança, no respectivo foral, e esporadicamente a Seia, talvez à conta de uma tradição urbana que remontava à época muçulmana. Certo é que a designação de cidade aparece, mas sem consistência, nos forais de outras povoações, porque, fora o caso de Tomar, se deve à cópia de formulários adoptados como paradigmas, como sucedeu com alguns que seguiram o modelo de Évora e o da Guarda, e, no caso específico de Penarroias, o de Bragança.

[79] T.T., Ch. D. Af. III, liv. I, fl. 3.

[80] T.T., F.A., m. 9, n. º 9.