sábado, 30 de outubro de 2021

1.3 - Documentos fundacionais

          1. Os primeiros exemplos.

        Os mais antigos documentos através dos quais chegamos ao conhecimento da vida de algumas comunidades humanas caracterizadas pela existência de coesão interna entre os seus membros e não apenas pela dependência de um poder externo — de natureza eclesiástica ou senhorial — datam, na Península Ibérica, de meados do século X. Em 950, Garcia Fernandes corroborava os foros concedidos a Melgar de Suso por Fernan Armentales[1], nos quais encontramos a primeira referência a um órgão de governo que pertence à própria comunidade: o concelho[2].

        Em território português, o primeiro testemunho do género é o foral de S. João da Pesqueira, outorgado entre 1055 e 1065 por Fernando I de Castela e Leão. É possível que documentos idênticos relativos a outras comunidades tenham existido, mas vicissitudes de índole diversa terão contribuído para impedir que chegassem aos nossos dias. S. Martinho de Mouros recebeu também um foral de D. Fernando I, depois confirmado por D. Teresa, mas apenas conhecemos a sua existência porque, em 1342, o meirinho régio convocou os moradores para reduzir a escrito os seus usos e costumes[3]. O Livro Preto da Sé de Coimbra conservou para memória futura o texto de confirmação dos costumes da cidade, feita pelo imperador Afonso VI, em 1085[4], assim como a carta consuetudinis de Santarém, de 1095[5]. A polissemia vocabular e os escassos dados facultados pela documentação não nos ajudam a tirar conclusões muito precisas sobre a existência de concelhos no sentido daqueles que estamos a estudar quando se referem a um ou outro concilum, em certas localidades. As dúvidas surgem-nos, por exemplo, em relação aos concelhos de Arouca e de Rio de Moldes, referidos em 1091[6], de um modo bastante vago. É difícil saber se se tratava de uma simples assembleia de magnates ou de um concelho em que já intervinham os populares. O concilium de Montemor-o-Velho é mencionado  em 1099[7] e 1111[8], mas o foral que se conhece relativo a esta localidade data de 1212.

        Tendo a Chancelaria Régia iniciado a sua organização apenas na segunda década do século XIII, com a elaboração de Livros de Registo dos principais documentos emanados do poder central, é bem natural que muitos textos que seriam importantes para a história das nossas mais antigas comunidades se tenham extraviado. Os documentos que possuímos, relativos aos concelhos, até ao reinado de D. Afonso II, limitam-se à categoria dos forais e muitos são conhecidos apenas através do registo das suas confirmações.

        Praticamente só no tempo de D. Afonso III a Chancelaria Régia passou a recensear outros documentos alusivos aos concelhos, para além dos forais. Durante este reinado e os dos monarcas seguintes, multiplicar-se-ão os diplomas de vária índole relativos aos municípios.

        No entanto, uma percentagem importante desses documentos, até ao fim do reinado de D. Dinis, continuará a ser constituída pelos forais. Tendo uma parte considerável dos nossos municípios sido criados até essa época, torna-se evidente que, na sua maioria, receberam um foral, ou pelo menos uma carta em que se declarava que lhes era concedido um foral idêntico ao de outra localidade.

            2. Foral: a designação.

         A designação de foral, aplicada a esta espécie de documentos, generalizou-se apenas em meados do século XIV[9]. Inicialmente, sem os diferenciar dos outros, referiam-se genericamente como carta, tendo em conta a sua realidade diplomática, enquanto suporte de um texto escrito; para especificar o seu conteúdo, isto é, o conjunto das disposições neles contidas, designavam-se como foro ou forum[10].

        O termo foro ou forum, em muitos desses e doutros documentos, aplicava-se todavia a realidades muito diferentes, designando ora o conjunto das prescrições nele contidas, ora as taxas das portagens, ora o estatuto social e jurídico de uma classe de pessoas (por ex., o foro de cavaleiro, o foro eclesiástico), ora, finalmente, as rendas a pagar sobre as propriedades rústicas ou urbanas. Dentro desta acepção, pode ainda referir-se à importância fixa ou cânone a pagar anualmente pelo domínio útil das terras, como sucedia nos contratos de enfiteuse ou emprazamento, também chamados de aforamento. Nem sempre é fácil distinguir, em relação a esta época, aquilo que hoje chamamos foral de um simples contrato de enfiteuse, não só por causa da imprecisão das fórmulas notariais, mas também por falta de clareza na distinção entre os direitos individuais de propriedade e o domínio político.

        Como exemplos da diversidade de acepções podem aduzir-se o foral de S. João da Pesqueira, em que a palavra forum designa o próprio diploma (istud vero forum firmavit rex domnus Fernandus), ou, num plano oposto, o de Aguiar da Beira, onde, entre outras, se lê esta passagem: “pedon vendat suam proprietatem ad quem voluerit et decimam restet in foro”, em que foro designa o imposto da décima que recai sobre a propriedade. Sucede até que num só documento se utiliza o vocábulo com mais do que um significado, como no foral de Évora, de 1166, onde forum designa o conjunto das disposições que integram o foral (damus vobis forum et costume de Avila), o imposto das sisas ou portagens (de portagem: foro de trosel de cavalo, de panos de lana vel lino, I solidum), ou o estatuto próprio de uma classe (si miles per naturam ibi perdiderit equum et recuperare non potuerit semper stet in foro militis).

        Nos séculos XI e XII não havia uma designação exclusiva reservada às cartas de foral e por isso aplicam-se-lhes as mesmas com que se referiam os outros documentos[11]. A designação mais simples com que se apresentam alguns forais é, como vimos, a de carta ou cartam, aparecendo também as de scriptum e de scripturam.

        Para vincar o valor que passavam a ter as disposições neles contidas, tal como outros documentos, alguns forais designam-se como cartam firmitudinis, cartam donationis et firmitudinis, cartam firmitudinis et stabilitatis, cartam firmitudinis et foro, cartam conventionis et firmitudinis, firmamenti cartam, cartam stabilitatis, firmitatis scripturam, etc. Raramente, e talvez a sublinhar o carácter unilateral do pacto, o foral é designado como decretum ou decreta.

        Quando os diplomas incluem já a oficialização do direito elaborado localmente, acrescenta‑se a palavra consuetudinem ou costume: forum et costume, consuetudinis cartam. Uma das designações mais usadas é simplesmente a de foro ou, em latim, forum, isoladamente ou acompanhada da palavra carta ou cartam: cartas de foro, fori cartam.

        Ao longo do século XIII, irão repetir-se quase todas estas designações, encontrando-se até fórmulas híbridas, como cartam donationis et firmitudinis de foro e cartam firmitudinis et perpetui fori, mas a mais usada será a simples expressão carta de foro, que já vinha do século anterior.

        Nas últimas décadas do século XIII começou a usar-se a palavra foral. Encontramo-la pela primeira vez no de Lagoaça, em 1286: “a tal preyto que façam foro e vezinhança, assy como he teudo no foral de Mogadoyro[12]. Mas é no século XIV que o vocábulo se generaliza. É utilizado nos capítulos especiais apresentados por várias povoações do reino nas cortes de Santarém, em 1331, onde, em paralelismo, e com frequência nos mesmos parágrafos, se usa ainda, no mesmo sentido, a palavra foro ou a expressão foro e costumes antigos. Em geral, na exposição feita pelos procuradores, em nome dos concelhos, emprega-se o termo foral, enquanto na resposta de El-Rei se continua a utilizar o termo foro, o que denota a origem e difusão popular do vocábulo, que a Chancelaria Régia acolhe com alguma resistência.

        Em 1341 a Chancelaria adoptava-o para intitular uma carta em que D. Afonso IV reduzia os tributos a pagar pelos habitantes do Barroso[13]. Em 1360, num documento em que integrava a terra de Valadares no alfoz de Melgaço, D. Pedro I referia as trezentas libras e os outros direitos que o concelho “he theudo de dar a mim em cada huum ano pello seu foral[14]. Em 1375, o vocábulo aparecerá novamente numa carta relativa a Valadares: “diziam que no tempo da guerra que foe antre nos e elrrey de castella se perdera ho orginal do dicto foral[15].

        Em 1361, o termo foral aparece na resposta dada pelo rei a uns agravamentos apresentados pelo concelho de Montemor-o-Velho: “Item diziam que eram agravados dos porteiros que levavam daquelles que vendiam os porcos na dicta villa a enxercas seis dinheiros de cada huum porco e que foy ja julgado e defeso per sentença que os nom levasem porque acharom que pello soldo que paga qualquer vizinho que pollo foral da dicta villa que diz que todo vizinho que soldo pagar que nom faça outro foro”. Observe-se como na última frase aparecem os termos foral e foro com significados totalmente diversos, o primeiro para referir o documento onde se fixa um estatuto jurídico, embora de alcance económico, e o segundo para designar uma determinada taxa ou renda a pagar. A distinção entre as duas palavras ainda não é total, como se verifica ao prosseguir na leitura, porque, no mesmo capítulo, foro é utilizado na acepção de foral: “E porque foy e é defeso que nom levassem os dictos seis dinheiros dos vizinhos em razam dos dictos porcos porque eram scusados per o dicto foro[16].

        Num elenco de documentos constantes da Chancelaria Régia elaborado na mesma época, embora sem data, mencionam-se à maneira moderna o foral de Vilar de Vaquas e o foral dos moradores de Vilarinho da Castanheira[17].

        A palavra foro, se não deixa de ser utilizada, passa a ter uma acepção cada vez mais restrita, ligada aos contratos de enfiteuse ou emprazamento. Foral é a designação que se impôs gradualmente, para referir aquilo que, em termos diplomáticos, do século XI ao século XIII, se chamou, entre nós, foro ou carta de foro, e, nas últimas décadas do século XV, era já a única palavra com que tais documentos se designavam.

        É, porém, de advertir que este significado se obnubilou com o andar do tempo, de tal modo que, se já nos próprios forais manuelinos predominava o seu carácter de listagem de rendas e tributos, quando, nos fins do século XVII e primeira metade do século XIX, se agitou a chamada questão dos forais, era das situações de enfiteuse e de outros ónus que pesavam sobre a terra que verdadeiramente se tratava.

    3. O significado do vocábulo foral.

        O foral define-se como um documento através do qual se reconhecia a existência de uma comunidade fixada num determinado território, concedendo-lhe um certo grau de autonomia, e se definiam as regras fundamentais que deviam ser observadas no governo dos interesses comuns e nas relações dos seus membros entre si, com os outros indivíduos que viviam no exterior e com a mais alta autoridade, de que estavam dependentes.

        Em casos excepcionais, podia um foral mencionar como destinatários imediatos um reduzido número de pessoas — desde uma ou duas, como sucedeu, por exemplo, com Miranda do Corvo — mas tinha como horizonte uma comunidade cuja formação e crescimento se pretendia incentivar.

        Essa comunidade vivia ou pretendia viver e trabalhar num determinado território, de limites mais ou menos bem definidos, eventualmente com uma ou outra excepção, correspondente a situações mais arcaicas, como terá sucedido no caso de S. João da Pesqueira, onde vigorava uma diferente concepção e organização do espaço, que tinha como referência não as fronteiras externas mas o centro material onde a comunidade lançara as raízes da sua unidade, daí partindo para um domínio gradual do território, que poderia estender-se até onde as suas necessidades o exigissem, mas se esbatia cada vez mais, conforme se distanciava do núcleo central[18]. O termo podia ter dimensões muito diversas, conforme o número de habitantes e as actividades a que se entregavam. Era reduzido nos burgos e póvoas dos séculos XI e XII, assim como nas comunidades rurais que se ocupavam quase exclusivamente no cultivo da terra, mas era mais extenso no caso dos grandes municípios que polarizavam a defesa e a administração dos territórios conquistados desde meados do século XII, segundo um esquema que se alargará gradualmente a todo o território, na segunda metade do século XIII.

        Os forais estabeleciam as normas pelas quais os membros da comunidade se deviam regular no convívio com os seus vizinhos, especialmente em matérias relacionadas com a justiça e com as responsabilidades comuns.

        O principal motivo que presidiu à sua outorga foi, com frequência, o de regulamentar os aspectos fundamentais das relações da comunidade com as instâncias exteriores do poder, das quais dependia, especialmente a nível tributário, judicial e militar, mas que deviam respeitar a sua autonomia nas questões do foro interno. Era nesta zona que se situava a diferença entre os forais ou cartas de foro municipal e as cartas de foro de aldeia: à ampla autonomia do município contrapõe-se uma autonomia muito limitada da aldeia, que, especialmente no foro criminal, e em relação aos delitos mais graves, mas por vezes também na esfera tributária e no foro militar, estava dependente do juiz do município ou do julgado. 

        Na maioria das circunstâncias, os forais apresentam-se como documentos fundacionais, na medida em que era a sua outorga que desencadeava os mecanismos que levavam à organização de uma nova comunidade; noutras, aparecem como concessões unilaterais ou como pactos bilaterais, através dos quais uma comunidade já existente via reconhecido oficialmente o seu estatuto; revestem, por vezes, o aspecto de documentos clarificadores e definidores das obrigações e dos direitos ou privilégios, como na época se dizia. Os simples contratos agrários colectivos não revestem este carácter fundacional, porque se limitam às questões relacionadas com a exploração da terra, pressupondo a existência de uma comunidade já organizada ou, quando muito, facultando-lhe meios para a sua gradual afirmação posterior.

        4. A iniciativa.

         A iniciativa da outorga de um foral podia partir de origens diversas: da própria comunidade, do poder central ou de entidades situadas a um nível intermédio.

        Temos notícias de comunidades cujos membros se juntaram e decidiram pedir ao Rei que lhes concedesse uma carta de foro. Os moradores de Melgaço, em data anterior a 1185, solicitaram a D. Afonso Henriques que lhes concedesse o foral de Ribadávia: “illud forum quod a me quesistis, scilicet de burgo de Ripa Avie”[19]. Em 1301, o povo da terra de Montenegro reuniu-se num lugar chamado Celeirós “a ouvir mandado de nosso Senhor ElRey sobre o foro de vila que lhy mandarom pedir a elRey que lhys desse en essa terra de monte Negro”[20]. Nas proximidades, aconteceu o mesmo com os habitantes da Lomba, que, em 1324, mandaram "pedir por merçee que lhis desse foro e lhy mandasse assinaar logar en que fezessem villa”[21]. Os exemplos multiplicam-se e teremos ocasião de referir alguns deles ao longo do presente estudo.

        Umas vezes é um alto magnate, investido em funções de poder, que outorga o foral de uma localidade, como sucedeu, por exemplo, em 1130, com o foral de Numão, que se ficou a dever a Fernão Mendes, “potestas in Bragancia et in Lampazas”, ou um mandatário do Rei, que, no âmbito das competências que lhe foram cometidas, define as regras a que deve obedecer uma determinada comunidade, como aconteceu com Guilherme de Cornes, em relação aos gálicos de Atouguia, ainda em tempo de D. Afonso Henriques; outras vezes é um funcionário régio – meirinho ou corregedor – que, depois de se inteirar in loco de uma situação concreta, propõe a fundação de um município: se em Azeitão foi o corregedor que, em 1366, deu os primeiros passos no sentido da criação de um novo concelho, ao determinar que aí houvesse um juiz eleito pelos moradores, também Rodrigo Mendes tinha outorgado, em nome de D. Sancho I, em 1195, o foral de Covelinas.

        A iniciativa pública local manifestou-se especialmente nas cartas de foro de aldeia, particularmente na área de Panóias, assim como no médio e alto Tâmega e nas terras de Barroso, onde se referem várias que foram outorgadas pelo concelho de Montalegre.

        Por vezes um senhor de velha estirpe ou um donatário recente assumem a iniciativa de uma outorga; assim aconteceu, entre outros, nos casos seguintes: Egas Gozendes outorgou o foral de Sernancelhe (1124); Paio Vilar, o de Moimenta do Douro (1189); Sancha Vermudes, o de Fontarcada (1193); Pedro Goterres, o de Alpreada (1202); Pedro Afonso, os de Figueiró dos Vinhos, de Arega (1201) e de Pedrógão (1206); Froile Hermiges, o de Vila Franca de Xira (1212); Martim Anes, o de Avelar e Almofala (1221). Podemos acrescentar os que foram outorgados pelo irmão e pela irmãs de D. Afonso II: Montemor-o-Velho (1212), Sarzedas (1212), Vila Nova ou Sobreira Formosa (1222). Pedro e Raimundo Peres, em 1223, deram a Lardosa o foral de Castelo Novo; Gil Martins, em 1262, concedeu a Terena o foral e os costumes de Évora. O foral de Portel ficou a dever-se a D. João de Aboim, em 1262, derivando dessa localidade o outro nome por que o outorgante é conhecido: D. João de Portel. Estêvão Rodrigues deu aos povoadores de Aguiar (do Alentejo) os foros e costumes de Santarém, em 1269.

        Mais frequentes foram as outorgas de forais levadas a cabo por instituições ligadas à Igreja: ordens militares, conventos e bispos. A listagem que se apresenta não é exaustiva e só estará completa quando se fizer, nessa perspectiva, um rastreio nos arquivos de todas as instituições eclesiásticas medievais.

        As ordens militares foram, neste conjunto, as responsáveis pelo maior número das concessões, quase todas com destinatários localizados a sul do rio Mondego: à Ordem do Templo devem-se os forais de Ferreira do Zêzere (1156), Redinha (1159), Tomar (1166/1174), Pombal (1174/1176), Castelo do Zêzere (1174), Castelo Branco (1213), Proença-a-Velha (1218), Ega (1231) e Penha Garcia (1256); à Ordem do Hospital, os de Freixiel (1209), Crato (1232), Proença-a-Nova (1244), Tolosa (1262) e possivelmente o de Nisa (a. 1232); à Ordem de Avis, os de Benavente (1200), Ericeira (1229), Avis (1253) e Seda (1271); à Ordem de Santiago, os de Canha (1235), Setúbal (1249), Aljustrel (1256), Mértola (1254), Garvão (1267) e Santiago de Cacém.

        Também entre os Bispos se registou uma actividade significativa: pelo Arcebispo de Braga foram outorgadas as cartas de foro de Redondelo (1192), Dornelas (1212-1228), Ervededo (1233), Gouvães (1250), S. Mamede de Ribatua (1262); pelo Bispo do Porto, a do burgo deste nome; pelo Bispo de Coimbra, as de Arganil (1114), Centocelas (1194), Teixeira e Souto de Rorigo (1206), Vale Florido (1257), Lourosa (1347) e Coja (1260); pelo Bispo de Viseu, a de Porco (1238); pelo Bispo da Guarda, as de Alvende (1214), Abrantes (1232), Idanha, Moreira de Castelo Mendo, Salvaterra do Extremo (as três de 1229) e Alter do Chão (1232); pelo Bispo de Évora, as de Alcáçovas e Viana do Alentejo (ambas de 1258).

        Mal conhecida é a acção que neste âmbito desenvolveram os abades de vários mosteiros e instituições similares, mas podem, mesmo assim, referir-se vários exemplos: o foral de Cedofeita (1237), concedido pelo abade do convento do mesmo nome; as cartas de Santa Comba (1102), de Mouraz (1198) e de Abiul (1206), pelo abade de Lorvão; as de Covas (1162), Justes (1222) e Torre do Pinhão (1223), pelo abade de Pombeiro; as de Alcobaça (1210), de S. Martinho do Porto (1257), de Beringel (1262) e de Aljubarrota (1316), pelo abade de Alcobaça; a de S. Julião do Tojal (1258), pelo abade de S. Vicente de Fora; a de Pedroso (1271), pelo abade do mosteiro de igual nome; a de Cepo (1237), pelo abade de S. Pedro de Arganil; a de Figueiró da Granja (1243), pelo abade de Tarouca; a de Valezim (1201), pelo Prior de Santa Cruz; a de Pinhel (1191), pelo Prior da Ermida; a de Alvito (1283), pelo Prior da Ordem da Trindade; a de Midões (1257), pela abadessa de Lorvão. E a estes se juntaram conventos de além-fronteira, como o de S. Maria da Estela, cujo abade outorgou a carta de foro de (Seixo do) Côa (1246), e o de Moreruela, a que se devem os de Ifanes (1219), Angueira (1257) e Palaçoulo (1293).

        No entanto, a iniciativa da outorga da grande massa dos forais portugueses partiu dos próprios monarcas. O “placuit nobis” do foral de Guimarães ou o “placuit mihi” do foral de Coimbra, de 1111, traduzem uma atitude que se repetirá centenas de vezes, desde o século XII até ao século XIV, como teremos ocasião de ver. 

        5. O processo em marcha.

         Antes de criar um município ou de outorgar um foral, El-Rei inteirava-se das condições existentes, que tornavam possível e conveniente ou mesmo necessária a respectiva criação e outorga. Uma das vertentes a considerar era a do espaço físico: as condições naturais do lugar, a sua salubridade, os seus recursos económicos, a sua relação com as vias de comunicação, a sua defesa em caso de guerra. Outra das vertentes que tinha de ser levada em conta era a dos efectivos humanos, ou seja a existência de povoadores, capazes de habitar na localidade, de a desenvolver e de suportar os encargos com o funcionamento do município e com o pagamento dos tributos devidos à Coroa.

        Numa carta que antecedeu em quatro anos a outorga do foral de Vila Nova de Cerveira, dirigida aos principais funcionários régios no terreno, dizia-lhes D. Dinis: “Bem sabedes, en como era meu talan de fazer huma Pobra, a par do meu Castello de Cerveira, e enviei vos sobre esso minha Carta, pera saberdes se havia hi homens, que hi quisessem pobrar, e enviastes me que havia hi peça deles”[22]. Ao mesmo tempo, encarregava-os de disponibilizar as terras necessárias para serem cultivadas pelos cem povoadores que aí desejava fixar, e de delimitar o respectivo termo.

        Os documentos revelam a existência de processos negociais, em muitos casos desencadeados por uma solicitação prévia dos povoadores, como sucedeu, por exemplo, em Melgaço e em Montenegro, conforme referimos. Do mesmo modo, foi a rogo dos habitantes de Monsaraz que D. Afonso III lhes concedeu o foro de Beja: “placuit mihi libenti animo et spontanea voluntate dare et concedere vobis tam presentibus quam futuris ibidem permansuris forum de Begis quod a me peciistis”[23].

        Em Montenegro, D. Dinis mandou ao encontro dos habitantes “dom Eytor Vicente vassalo e pobrador do dito nosso Senhor el Rey”, que os convocou “pera virem a este dia ao logar que chamam Celeyroos” onde se pensava instalar a sede do concelho, e aí “a ouvir mandado de nosso Senhor ElRey sobr’o foro de vila que lhy mandarom pedir a elRey”, que lhes propôs a contrapartida do pagamento de um foro anual de três mil libras[24]. Mas os tributos a pagar ao Rei não eram as únicas condições impostas aos moradores. Uma das obrigações que se repetia com mais frequência era a da construção dos muros. Assim aconteceu com a Torre de Dona Chama, cujos moradores, em 1287, ficaram obrigados a “fazer essa vila e muralalha[25] de Muro”[26]. Os moradores da Lomba, que tinham carta de foro de aldeia, sob a dependência de Vinhais, desde 1311, conseguiram a sua autonomia em 1324, garantindo que “que eles fariam hy a ssa custa hūa cerca de muro de cem braças per deffendimento dessa terra” e pagariam “em cada huum ano duzentas libras de portugueses de foro aas terças do ano”[27]. Ainda em 1372, os moradores da terra que tinha o centro no castelo de Neiva (de que pouco mais resta que o nome de uma freguesia: Castelo de Neiva) obtinham a categoria de município, “com esta condiçam que elles façam hūa cerca no monte que sta coom o dicto castello de tal feitura qual he o dicto castello e que façam na entrada da dicta cerca hūa torre tal e tam alta como cada hūa das que no dicto castelo stam e hūa cisterna dentro na dicta cerqua”[28].

        Em 1292, é o concelho de Alter, até aí no gozo de uma autonomia mitigada, sob a dependência do concelho de Abrantes, que, ao negociar com o delegado de El-Rei a adopção do foral de Santarém, impõe as suas condições: “queriam em Alter filhar foro de Santarem e que o filhavam com estas condições que nom dem jugada de todo o termho d Alter que agora ha e que todolos seos herdamentos e casas e vinhas e ortas que agora hy am que ElRey non lhos mande partir nem tolher e que ElRey nunca de essa vila d Alter em doaçam nem en cambho a nenguum”, e nem sequer as custas estavam dispostos a pagar: “outrossy que ElRey lhy de carta de foro de Santarem de guysa que nom custe dinheyros ao Conçelho d’ Alter”[29].

Também em 1292, D. Dinis concedeu um foral, que seguia como modelo o de Prado, aos moradores da póvoa que então se formava à volta do castelo de Lanhoso, o qual foi provavelmente entregue ao procurador dos homens da Póvoa de Lanhoso três dias após a data da outorga, contra a apresentação de uma carta em que o mesmo se comprometia, em nome dos seus representados, a “pobrar a dicta pobra de Lãyoso de cento homeens de la dada desta carta ata tres anos comprydos”[30]. Quando em 1311, ou pouco antes, os moradores de Alva (freg. de Poiares, concelho de Freixo de Espada Cinta), pretendiam ganhar a sua autonomia, ou recuperar a que haviam perdido no tempo de D. Sancho II, o concelho de Freixo de Espada Cinta manifestou a sua oposição frontal, o que só podia ter acontecido se previamente tivesse sido consultado sobre o assunto. Perante a oposição do concelho de Freixo, os moradores de Alva, que se queriam alçar a concelho, sacudindo a dependência em que estavam, prometendo reunir aí quatrocentos homens que a povoassem e pagar ao Rei oitocentos foros, pedindo “que os fezesse eisentos e lhis desse termho e foro”, viram os seus intentos gorados[31].

Em 1317 foram os procuradores dos habitantes de Valadares, no Alto Minho, que, na Cúria, assumiram o compromisso de pagar a renda anual de trezentas libras, antes de El-Rei outorgar o documento que lhes concedia a autonomia municipal[32].

        De 1362 a 1364, a fundação do concelho de Sines exigiu uma negociação em que, além dos moradores e do Rei, foi contactado o Mestre de Santiago, por causa dos direitos que tinha sobre o lugar[33]. Cascais alcançou a autonomia em 1364, na sequência de uma proposta que os homens bons do lugar fizeram ao Rei, de que lhe dariam “em cada huum anno duzentas libras mais aallem daquillo que me rendiam os meus direitos que eu avia do dicto logo”[34].

            6. A função do povoador.

         Sem obstar à participação de outros agentes, desempenharam um papel importante na condução do processo os enviados régios que a documentação da época designa como pobradores, embora, ao que parece, a fase mais importante da sua actividade se tenha seguido à outorga dos forais e se concretizasse na ordenação e implementação das estruturas materiais e humanas de que dependia a consolidação e o funcionamento do novo município.

        Podemos escalonar uma série de exemplos. Em 1261, dirigia D. Afonso III uma carta ao pobrador, aos alcaldes e ao concelho de Viana da Foz do Lima: “A vos João Gonçalves meu pobrador e aos alcaldes e ao concelho de Vianna, saude e amor e mando vos que poboredes bem essa villa e fasades ahi cheguar todos os vezinhos e aduzir seu paom, seu vinho a villa e correr todolos caminhos do couto pella villa”[35]. À data da outorga do respectivo foral, em 1284, era “Paay anes pobrador de Camynha”[36] e o seu nome aparece até 1288, numa série de contratos de escambo relacionados com a nova fundação. Em 1287, a propósito de Torre de Dona Chama, diz El-Rei: “devia eu lhy meter meu pobrador que pobre a terra”[37]. Uma sentença régia de 1288 ilibava “Steve Perez meu Pobrador em Chaves” de uma queixa de Gonçalo Rodrigues, que o acusava de lhe ter tomado uma herdade. Em 1300, D. Dinis ratificava o escambo feito por “Affonso Rodriguiz pobrador de terra de Bragança da aldeia de Sanceriz, que era del Rey, por Cacerelhos”[38]. Em 1301, os habitantes de Montenegro “pedirom por mercee a nosso Senhor el Rey assi os procuradores, como os homeens dessa terra, que presentes eram, que lhis desse por pobradores Eytor Vicente seu vassalo e Fernam taballiom de Bragaa seu scrivã”; este Heitor Vicente figurou aliás, como delegado do monarca, nas negociações com os moradores[39]. Numa carta de 1308, dirigida a João Peres “pobrador na Torre de Meem Corvo”, mandava-lhe D. Dinis que entregasse aos moradores de Sambade as suas terras e aldeias: “vista esta carta entreguedes aos dictos moradores de Sanbadi sas terras e sas aldeyas e seus herdamentos e seus termhos assi como ante estavam e ouverom as dictas cousas en no tempo de meu padre e no meu”[40].

        Em 1362, os juízes, vereadores, concelho e homens bons de Vinhais, pediram a D. Pedro que lhes desse um povoador como convinha para a terra, indicando o nome de Salvador Domingues, mercador e residente na vila, porque era “homem boom e asesegado e quite de mãaos fectos”[41]. D. Dinis procedeu à nomeação, mas, por óbito ou por qualquer outra razão, Salvador Domingues já não estava no exercício dessas funções em 1365 e uma parte dos moradores decidiu propor Afonso Mouro ou Pedro Salvadores para o cargo, mas D. Pedro achou que não era de nomear outro povoador e que as suas funções deviam ser desempenhadas pelos juízes do lugar[42].

        Entre as principais tarefas do povoador, no caso das fundações ex novo, contava-se a escolha e a delimitação do local onde se devia implantar o novo centro urbano, as diligências conducentes à edificação das muralhas, a definição dos espaços destinados à fruição pública e dos lotes reservados à construção das habitações individuais, no interior da povoação, e às culturas agrícolas no aro rural circundante. Competia-lhe igualmente promover a afluência de moradores e pôr em funcionamento os órgãos do governo municipal.

        A escolha do local onde a vila ou sede do município devia ser implantada era de grande importância para evitar que a fundação se malograsse por falta de condições ou que mais tarde se tivesse de proceder à sua transferência. O município de Pena da Rainha não vingou, porque o local que lhe servia de sede não reunia as condições mínimas para um ulterior desenvolvimento urbano. Por razões de salubridade, Mirandela transferiu a sua sede, em 1282, para um lugar então chamado a Cabeça de S. Miguel[43]. Por volta dessa data, Santa Cruz da Vilariça teve de se mudar para outro local, daí resultando também a posterior alteração do nome para o de Torre de Moncorvo. Mais tarde, em 1316, a vila de Castro Vicente transferiu-se para o lugar da Cabeça da Cruz, porque aquele onde estava era doentio[44].

        Uma função importante era a distribuição de terras pelos cultivadores, a que, por isso, o foral de Vila Nova (de Famalicão) chama divisores: “ut sint XL.ª divisores qui habeant casas et ortos et qui laborent illo regalengo”[45]. Por altura da fundação do município de Caminha, D. Dinis promoveu uma série de escambos de herdades, com a finalidade de criar dentro do alfoz uma vasta superfície “pro ad coyrelas de vicinis”, como diz o foral[46].

        Em 1304, lembra-se que em Vila Real, “quando a terra foy pobrada”, se planeara a fixação de quinhentos moradores, número que já correspondia a uma redução para metade do número inicialmente previsto, pelos quais seriam distribuídas outras tantas coirelas, e “essas quinhentas coyrelas nom devem mays ser partidas nem demarcadas se nom secundo como forom partidas e demarcadas per mha carta e per meu pobrador”[47]. Ao tratar da fundação de Vila Boa de Montenegro, em 1301, é delimitado um vasto território para distribuir pelos moradores: “E a dicta villa deve aver por termho Celeyroos e Famoynha, Gondemar, o Ledayro, Vila Nova, Astaãos, Vilarim danião e Paaço com seus termhos pera acoyrelarem se pera os que morarem dentro na dicta vila”[48]. Os homens que, em 1317, estão na disposição de povoar Cerveira, pedem “pera acoirelamento desa pobra vinte e oito casaes, que hi a juntados com esse logar”[49] e o Rei acrescentou mais um, concedendo-lhes um total de vinte e nove!

Às coirelas nortenhas, correspondiam, com outro enquadramento e com outras dimensões, os sesmos mencionados pela documentação relativa ao território localizado a sul do rio Tejo. A distribuição dos sesmos fazia-se, porém, em data posterior à institucionalização dos concelhos, que nomeavam os sesmeiros[50] responsáveis pela atribuição das terras. Conhecemos apenas um caso, respeitante ao concelho de Serpa, em que os sesmeiros foram nomeados pelo Rei, mas essa situação ocorria já em 1371 e ficou a dever-se a D. Fernando[51].

        7. Os objectivos.

Os objectivos que presidiram à outorga dos forais e à criação dos novos concelhos ou ao reconhecimento oficial daqueles que não possuíam um documento nem a memória de um acto formal relativo à sua fundação podem considerar-se a diversos níveis, numa perspectiva mais próxima ou num horizonte remoto.

        7.1. Objectivos imediatos.

Os objectivos imediatos dos forais eram sem dúvida os de fixar moradores e  fundar novos aglomerados habitacionais, promover o arroteamento e o cultivo das terras, criar estruturas de apoio aos viandantes, no cruzamentos dos principais eixos viários, disponibilizar meios de protecção civil e política aos homens livres de modestos recursos económicos, e contrabalançar os poderes senhoriais, de modo a evitar o seu crescimento excessivo e a aglutinação dos mais fracos.

Ao povoador de Viana da Foz do Lima, como vimos, dizia D. Afonso III, em 1265: “mandovos que poboredes bem essa villa e fasades ahi cheguar todos os vezinhos e aduzir seu paom, seu vinho a villa”. O foral concedido em 1294 a Alfândega da Fé apresentava como primeiras actividades dos moradores a construção das casas e a plantação das vinhas, que tinham de estar concluídas no prazo de um e dois anos, respectivamente[52]. No foral dado à Póvoa dos Paços de Sanfins (Maiorca, Figueira da Foz), em 1377, impunha-se aos moradores “que as casas que ora teem feitas que as telhem da dada desta carta ataa huum anno e que as outras que hi despois fizerem esso meesmo”[53].

 O arroteamento e a consequente exploração da terra foram o grande motor do povoamento, com especial ênfase em certas áreas geográficas, como a de Trás-os-Montes. A principal fonte de riqueza encontrava-se no solo e conseguia-se através do seu cultivo. Além de outras medidas, os forais impunham o pagamento de vários tributos e os meios para os liquidar só desse modo se obtinham, pelo que os homens não só tinham de extrair da terra o seu sustento como necessitavam de criar excedentes que lhes permitissem dar resposta a esses e a outros encargos.

Mas os forais também contêm medidas positivas no sentido de incrementar o desenvolvimento agrícola. O próprio Rei se responsabiliza por certas estruturas, como aconteceu em relação a Salvaterra de Magos, em que assumiu encargos de fundo: “eles arrompam o paul (...) e eu devo teer as abertas e as pontes”[54]. Aos moradores (da Póvoa) de Varzim, em 1308, impunha-se a obrigação de arrotear as terras, dando-lhes, para a adubação, o exclusivo do argaço recolhido nas praias do termo[55]. No Cartaxo, a partir de 1312, os arroteadores dos montes maninhos estavam dispensados de pagar qualquer renda ou tributo pelo prazo de três anos, a contar do início dos trabalhos[56]. Esta isenção temporária repetiu-se a favor de numerosas outras localidades.

A fundação dos municípios foi um acontecimento importante para a defesa das liberdades e direitos dos homens livres, de modestos ou médios recursos económicos, contra as prepotências dos grandes. Nessa perspectiva, o município tornou-se um aliado fundamental da monarquia, contra a ampliação crescente do domínio dos poderosos sobre o território e sobre as gentes.

Muitos forais, especialmente entre os mais antigos, estabelecem a proibição de os nobres viverem na sede ou mesmo no termo do município. Um grande número de cartas, na sua maioria outorgadas ao longo dos reinados de D. Afonso III e de D. Dinis, mas também outras, estabelecem expressamente a proibição de doar, vender, legar e deixar em testamento ou de qualquer forma alienar, a favor de nobres, igrejas, eclesiásticos, conventos, religiosos ou donas (freiras), qualquer herdade situada no termo do município ou da aldeia.

A preocupação de arrumar a um lado os municípios e a outro lado os privilegiados é visível, por exemplo, nos processos relacionados com a outorga dos forais de Viana da Foz do Lima, de Caminha e de Vila Real de Trás-os-Montes[57], que foram precedidos ou acompanhados de um processo negocial de alguma complexidade, destinado a evitar que dentro do seu alfoz permanecesse alguma propriedade com estatuto diferente.

Em 1258, o concelho de Zurara denunciava o procedimento insólito com que se facultava aos fidalgos, vindos de outras terras (em rigor, o texto refere-se aos “cabalarios de alia parte”), a fixação no termo do município e, em consequência, a ingerência nos assuntos da comunidade local e a usurpação dos direitos desta: “homines ipsius terre faciunt caballarios de alia parte suos vicinos in una hereditate aut in una domo aut in una arbore”. Contra esta prática abusiva, D. Afonso IV determinou, sem contemporizações, “ut nullus caballarius neque aliquus alius homo de alia parte veniat ibi populare neque morari neque teneat ibi maladiam neque comendam nec faciat ibi tortum neque forciam”. Não se tratava de simples cavaleiros vilãos, porque, diz o monarca, quem, desobedecendo a esta ordem, “ibi venerit populare aut habuerit ibi maladiam, aut comendam aut fecerit ibi tortum aut forciam sanet illud sicut iacet in illa carta et in illo foro ad quod populaverunt Zuraram, et mando quod accipiatis ei illam hereditatem quam ita ibi habuerit, et mictatis illam in meo regalengo”[58]. Mais tarde, em 1323, D. Dinis viu-se obrigado a advertir o concelho de Pinhel de que não devia autorizar os poderosos a fazerem coutos na terra[59].

O juiz de Valpaços pagou com a vida o facto de ter denunciado alguns nobres que se tinham apoderado de bens reguengos, pouco antes de 1283[60]. Pela mesma data, o concelho de Prado teve de litigar contra um nobre, chamado Mendo Martins, para reivindicar um herdamento localizado em S. Marinha de Oleiros[61]. Corria o ano de 1289, quando na terra de Barroso se registava que “os que hy forom mays poderosos na terra derom divisões e encurtarom os meus herdamentos foreyros e fezerom as Pobras maleciosamente e a dano dos pobres”[62].

Nem sempre a luta dos municípios em defesa da sua autonomia foi bem sucedida, especialmente quando os monarcas puseram levianamente em prática uma política de doações lesiva dos interesses dos povos, contra a qual estes se viriam a manifestar, especialmente através dos seus representantes nas cortes. Essa política, que afrontou os municípios e levou o país à ruína, foi levada ao paroxismo no reinado de D. Fernando, conforme oportunamente veremos.

 A criação de povoações ao longo da estrada era o modo de proporcionar certos meios de apoio aos viandantes: tabernas, albergarias, lojas de ferradores, tendas de comércio passavam a situar-se nos cruzamentos e noutros pontos mais estratégicos. Esse objectivo concorreu para a fundação de um conjunto de núcleos urbanos atravessados pelas vias de comunicação ou a facear com elas, a distâncias quase regulares, correspondentes a jornadas e a meios dias de viagem. Ao longo do século XIII e XIV, assistiremos a várias reclamações de municípios junto do governo central, que demonstram a importância que para as povoações tinha o facto de serem atravessadas pelos caminhos de ligação, em função dos quais se tinham desenvolvido. Citam-se alguns exemplos.

O caminho que dava passagem aos recoveiros e mercadores era fundamental para a economia da Guarda, por isso afectada, em 1342, com uma taxa que os afastava da povoação, a qual era superior às habituais portagens, conhecida pelo nome de “campo” e aplicada pelos rendeiros da portagem[63].

Os recursos de que viviam os moradores de Alcáçovas (Viana do Alentejo) provinham em boa medida do negócio que os moradores faziam com os viandantes, e, verificando-se uma tendência em contrário, o concelho diligenciou junto de D. Pedro I, em 1361, para que os caminhos de ligação entre Beja e Montemor-o-Novo e entre Évora e Alcácer do Sal passassem obrigatoriamente pelo interior da vila[64].

Em 1362, D. Pedro I determinou que todos os que circulavam entre Portugal e a Galiza pelo nordeste do Minho passassem pelo caminho que ia pela vila de Melgaço, para evitar os abusos, “porque me foy dicto que se fazia per o dicto caminho muitos maaos fectos e que eu perdia porem muitos dos meus direitos das cousas que per el levavam“[65].

Em 1375, o concelho de Moreira de Rei mandou dizer ao monarca que, noutros tempos, a maior parte dos habitantes da vila morava num arrabalde situado no exterior da cerca e atravessado pelo caminho, vivendo principalmente do negócio que faziam com os viandantes, a que vendiam o pão, o vinho e outros artigos, mas, chegados os tempos da guerra, foram para dentro da cerca, tendo os caminheiros continuado a fazer o antigo trajecto, mostrando-se avessos a utilizar o que passava pelo interior das muralhas, o que redundava em prejuízo dos moradores[66].

Em 1301, D. Dinis decidiu fundar duas povoações – Asseiceira e Atalaia – com a finalidade expressa de proteger os caminhos que atravessavam o sobral de Aveiras (Alaveiras), ou mais rigorosamente “entre a agua da Cardiga e de Beselga”, frequentados por toda a espécie de malfeitores, que assaltavam, roubavam e matavam[67], e encarregou da fundação o concelho de Torres Vedras[68].

        7.2. Objectivos últimos.

Para além dos objectivos imediatos que se alcançavam com a outorga dos forais e com a fundação de novos municípios, outros objectivos de fundo se atingiam, designadamente o desenvolvimento económico e social do país, no seu conjunto; a defesa e a consolidação das fronteiras, tendo em vista especialmente os seus inimigos externos, e, nos primeiros tempos, até a expansão territorial; o equilíbrio entre as várias forças e poderes que se defrontavam na sociedade.

A criação de uma teia de municípios, repartidos de norte a sul, por todo o território, com os respectivos centros urbanos, as feiras periódicas e uma rede viária correspondente às necessidades da época, proporcionou uma crescente animação da economia, estimulando a criação de excedentes, a multiplicação das trocas e a circulação de pessoas e bens, contribuindo ao mesmo tempo para despertar e cimentar a consciência de uma unidade na diversidade, que é a base do sentimento nacional.

O desenvolvimento económico do país resultou não só da soma do desenvolvimento das suas parcelas, mas também da intercomunicação e do intercâmbio entre umas e outras. A circulação dos almocreves[69] e dos mercadores, facilitada pela existência de numerosos pontos de apoio, nas vilas e nas cidades, onde se encontravam também os seus numerosos clientes, foi complementada com a criação de um grande número de feiras[70], com várias periodicidades e durações, a que correspondiam diversos raios de influência territorial. O funcionamento da feira só era possível nos lugares onde as estruturas municipais a pudessem enquadrar e por isso as cartas de feira tinham sempre como destinatário um município.

As mais antigas feiras de que entre nós ficou memória segura, até 1206, foram as de Constantim, Ponte de Lima, Melgaço e Vila Nova (Famalicão). Constituíram, com as cidades então existentes, os pilares mais importantes da economia portuguesa durante mais de um século. Depois da fundação da Guarda, juntou-se-lhes Castelo Mendo.

Com D. Afonso III a rede de feiras alargou-se a todo o país. Entre as que foram então criadas, destacam-se, pelo seu alcance, as feiras anuais com a duração de quinze dias, repartidas de norte a sul: Bragança, Trancoso, Guarda, Penamacor, Covilhã, Elvas, Évora e Beja. Com D. Dinis o número de feiras criadas com esta periodicidade e duração quase duplicou: Valença, Miranda do Douro, Vila Real, Mesão Frio, Celorico da Beira, Castelo Mendo, Sabugal, Leiria, Arronches, Olivença, Borba, Terena, Alvito, Moura, e Loulé. Sem referir as de menor duração, juntaram-se-lhes sete feiras anuais com a duração de trinta dias: Gaia, Torre de Moncorvo, Lamego, Torres Vedras, Santarém, Beja e Ourique. Ocupar-nos-emos novamente delas, ao tratar do reinado destes dois monarcas. Esta multiplicação das feiras e o fervilhar económico que por um lado lhes fornecia suporte e por outro delas tirava alento dão bem a imagem da época de desenvolvimento e de prosperidade que se vivia em Portugal.

A defesa do território, no seu conjunto, assentava em grande parte nos municípios, que ergueram uma vasta rede de castelos[71] e fortalezas, garantiram a sua manutenção e vigilância e guarneceram em tempo de guerra. Um dos critérios que podemos utilizar, em caso de dúvida, para dizer se uma localidade recebeu uma carta de foro de município ou uma carta de foro de aldeia é a existência ou a obrigação de construir muralhas. Só os municípios dispunham dos recursos humanos e financeiros para as erguer e para as guarnecer e era o elevado número de moradores, na sede e na periferia, que recomendava a existência de um local onde se pudessem refugiar em caso de guerra. Os habitantes das aldeias distribuídas pelo alfoz ajudavam os da sede a construir os equipamentos defensivos e a tratar da sua defesa. Embora com características próprias e seguindo vias diferentes, poderá dizer-se que ao longo da Idade Média, não só no século XI e XII, mas também nos séculos XIII e XIV, houve entre nós um processo de “incastellamento”, que não impediu, no entanto, a multiplicação e o florescimento das aldeias.

Em muitos dos forais mais antigos, o castelo aparece como já existente, à data da respectiva outorga, mudando apenas a relação entre ele e a comunidade, que passa a ser responsável pela sua manutenção e defesa. Assim acontece em Penela (1137), em Arouce (1151), em Sintra (1154), em Mós (1162), onde o Rei manda dar aos peões e aos cavaleiros todas as armas com que o defendam, em Penarroias (1187), em S. Cristóvão (1189), em Sesimbra (1201), em Taboadelo, Fontes e Crastelo (1202) e em Rebordãos (1208). Nas margens do Mondego e daí para sul, pelo menos até ao rio Tejo, tinham uma grande importância, como componentes do sistema defensivo, as atalaias ou sculcas, cujo encargo era normalmente repartido entre o Rei e os concelhos. São expressamente contempladas, especificando essa repartição das obrigações, nos forais de Coimbra (1111) e noutros dele derivados, como os de Penela (1137), Leiria (1142), Tomar (1172), Pombal (1174), Coimbra, Santarém e Lisboa (1179), e nos que seguem estes, como Povos (1195), Alcobaça (1210), Alenquer (1212), Montemor-o-Velho (1212), Vila Franca de Xira (1212) e muitos outros, ao longo dos séculos XIII e XIV.

Também na segunda metade do século XIII e nas primeiras décadas do século XIV, foram criadas “vilas” para dar apoio a castelos já existentes, e, nos documentos relativos à fundação de outras e à anexação de aldeias, menciona-se expressamente a construção dos muros. Podemos citar, entre outros, os exemplos de Bragança[72], de Mirandela (1293)[73], de Olivença (1309)[74] e de Alegrete (1319)[75]. Na fundação de Vila Real (de Trás-os-Montes) não se descurou a defesa, tendo o Rei assumido todos os encargos com as obras de fortificação: no foral de 1289, fica estatuído que “Elrrey deve fazer seu muro longo e boo, e deve o a guardar o Concelho assy come custume do Reyno”[76], disposição que se repete nos anos seguintes e encontra paralelo em documentos relativos a outras localidades.

O compromisso de construir um castelo ou uma muralha que circunde a povoação é muitas vezes a condição prévia para que o Rei atenda o pedido de criação de um município. No processo que conduziu à outorga do seu foral, os habitantes da Lomba, pediram ao monarca “que lhis desse foro e lhys mandasse assinaar logar em que fezessem villa na dicta terra da Lonba e que eles fariam hy a sa custa hua cerca de muro de cem braças per deffendimento dessa terra”[77]. A situação repetiu-se em relação a Alegrete, a Segura, a Vila Nova de Foz Côa, cujos moradores devem “fazer muro en essa vila de duzentas braças en rredor e alto quanto poder tanger huum cavaleiro de cima d’huum cavalo com hua lança de nove covados açima”[78], e ao Redondo, onde os moradores “an a ffazer a ssa custa huum castelo em essa vila do Redondo tamanho come a cerca da vila do Alandroal e tão alto e tan ancho e com duas portas e en cada hua das portas dos cubelos”[79]. Também pela carta em que D. Afonso IV, já em 1341, reconhece definitivamente a autonomia de Sousel, que por conseguinte se pode equiparar a um verdadeiro foral, somos elucidados de que os moradores se propunham edificar um castelo[80].

A construção de fortificações não era um encargo exclusivo dos concelhos, uma vez que o Rei, como era natural, assumia também a sua parte. No foral concedido a Caminha, em 1284, D. Dinis doou ao concelho a terça da décima das igrejas “pro ad refficiendum muros”[81] e repetiria a mesma disposição no foral de Vila Nova de Cerveira[82]. A partir de uma certa altura, no reinado de D. Dinis, generalizou-se a seguinte distribuição das tarefas: o concelho erguia a muralha da cerca e o rei encarregava-se da construção da alcáçova: por exemplo, no foral concedido à Torre de D. Chama, em 1287, especificava-se que “esses povoadores devem a fazer essa vila e muralalha de muro. E se eu hy quizer fazer alcaçava fazela per mim e fazela guardar per mha conta”[83].

 Baseava-se cada vez mais na organização dos municípios o novo exército, disponível para actuar em resposta ao apelido do Rei e sob o seu comando, o qual era formado pelas milícias municipais, fundamentalmente constituídas pelos cavaleiros vilãos[84]. Os peões colaboravam sobretudo na guerra defensiva, participando na anúduva. O privilégio de não ir a apelido, a não ser até lugares aonde num só dia fosse possível ir e voltar, correspondia a esta obrigação de se manter disponível para defender a própria localidade onde o cidadão habitava.

Os cavaleiros eram cidadãos que possuíam bens suficientes para adquirir e sustentar um cavalo com que pudessem participar na guerra, encargo compensado com certos privilégios. Inicialmente esse estatuto estava reservado aos nobres, mas depois foi alargado aos vilãos que atingissem um certo nível de prosperidade económica. Nos forais do grupo de Évora, os cidadãos que possuíssem uma aldeia (entendida como o conjunto das casas que estavam no centro de uma herdade), um jugo de bois, quarenta ovelhas, um asno e dois leitos eram obrigados a adquirir cavalo, passando, a partir daí, a fruir também dos correspondentes privilégios. Já antes do foral de Évora, em Penela, os agricultores que tivessem dois ou mais jugos de bois, dez ovelhas, duas vacas e um leito com seus panos estavam sujeitos a essa obrigação[85]. A partir do segundo quartel do século XIV, no reinado de D. Afonso IV, o recrutamento dos cavaleiros passou a fazer-se em função das “contias”, isto é, do valor atribuído à sua fortuna.

Através dos forais de Coimbra, Santarém e Lisboa, de 1179, torna-se clara a importância das milícias municipais como parte integrante e mesmo como componente de elite do exército régio: os cavaleiros vilãos não deviam ser relegados para a retaguarda mas sim colocados na dianteira.

Obrigados a comprar cavalo, quando a sua fortuna o permitisse, os habitantes dos municípios deviam também adquirir as armas com que iriam servir. Nos forais e noutros documentos relativos aos municípios, encontramos referências às principais armas então usadas. Em Miranda do Corvo referem-se, em 1136, a lança e a porrinha, a que se junta o clipeo (escudo). No mesmo ano, em Seia, à lança e à porrinha soma-se a espada e o alfanje. Em Arouce, encontramos, em 1151, a espada, a lança, o cutelo, a porrinha e o escudo. A lança, a espada (gladio), o cutelo e a porrinha, em 1154, são acompanhadas em Sintra pela cota de malha (lorica), pelo elmo e pelo escudo. O foral extenso de Castelo Rodrigo refere a loriga, o lorigon, o capelo, o almofar e as brafoneiras[86]. Na cidade de Évora, em 1306, entre as armas que os moradores possuíam contam-se o alfanje, a espada, o estoque, o dardo, a lança, o cutelo, o punhal, a porra e a besta. Esta última arma, especialmente eficaz e mortífera, levará à formação de um corpo militar especial, o dos besteiros, que devem ter desempenhado um papel fundamental nas campanhas da reconquista, desde o início do reinado de D. Afonso Henriques, e se continuaram a aperfeiçoar, ganhando tal importância que o foral de Coimbra, Santarém e Lisboa, de 1179, lhes reconhece um estatuto idêntico ao dos cavaleiros: Balistarii habeant forum militum[87]. Na segunda metade do século XIV difundiu-se o uso dos arneses, encontrando-se num documento de 1374, relativo a Sarzedas e a Sobreira Formos, o testemunho da imposição feita pelos corregedores aos concelhos para que estes os adquirissem, em ordem a equipar alguns dos seus militares[88].

Diversos documentos testemunham os serviços prestados pelos municípios, em ocasião de guerra. Teremos posteriormente ocasião de referir alguns deles, mas citamos aqui três exemplos que mostram como o Rei tinha consciência da importância desses serviços. Ao doar os castelos de Caia Maior e de Alvalade ao concelho de Elvas, em 1296, D. Dinis louvava os moradores deste concelho “porque elles an gran coraçom de me servir”[89]. Dos moradores de Tavira declarava D. Afonso IV, em 1338, que “me servirom en esta guerra bem e como devyam tambem por mar come per terra come en deffendimento dessa vila”[90]. Em 1373, D. Fernando concedia vários privilégios aos moradores de Coimbra, recordando os bons serviços que lhe prestaram na guerra contra D. Henrique de Castela “por seer exemplo pera sempre aos outros concelhos”[91]. Agradecimento idêntico lhe mereceu o concelho de Santarém[92].

         8. A outorga.

Definidos os parâmetros essenciais de uma nova concessão, era o momento de entrarem em acção os serviços que lhe deviam dar a forma definitiva. Os forais não se distinguiam fundamentalmente, sob o ponto de vista formal, dos outros documentos elaborados na mesma época, e reflectem, do mesmo modo, as vicissitudes dependentes das circunstâncias em que foram redigidos e a evolução por que passou a chancelaria régia. Advirta-se, porém, que só uma parte dos documentos utilizados na elaboração deste estudo se inclui na categoria dos forais.

Uma vez decidida a outorga do foral, seguiam-se os trâmites que conduziam à redução a escrito da respectiva carta. Os documentos transmitiram-nos, em regra, o texto final, e não é fácil obter dados que nos elucidem de uma só vez acerca do processo seguido para a ele se chegar. A análise de alguns documentos permite-nos, no entanto, tirar algumas conclusões a esse respeito. Assim, podem-se distinguir várias fases até se encontrar a forma definitiva.

Numa primeira fase, procedia-se à recolha dos elementos necessários e nela interviriam os delegados régios e a população local ou os seus representantes. Quando a iniciativa da outorga estava ligada a uma petição dos destinatários, já dessa petição constariam certos dados fundamentais, como a identificação do lugar, os seus limites territoriais, os habitantes, os recursos locais, especialmente aqueles sobre que iriam recair os tributos a pagar ao cofre régio. Quando esses dados ainda não constavam de uma petição ou de uma proposta inicial, era necessário proceder à sua recolha. Fizemos já referência e faremos outras aos contactos estabelecidos com os moradores de várias localidades na véspera da fundação dos respectivos municípios, os quais naturalmente serviam também para a recolha dos elementos necessários, como sucedeu com Melgaço, Viana, Cerveira, Caminha, Vila Real, Vila Boa de Montenegro, Segura, Lomba, Torre de Moncorvo...

Dadas as peculiares circunstâncias da sua outorga, o conteúdo do foral concedido a Coimbra em 1111[93] foi objecto de um processo negocial, cujos meandros se desconhecem. O foral de Arganil (1114)[94], embora não de outorga régia, é a mais antiga destas cartas cujo teor ficou literalmente marcado pelo decurso das negociações: já depois de escrito o núcleo básico do texto, onde o Bispo de Coimbra fala na primeira pessoa do singular (ainda os prelados se não teriam convertido ao plural majestático), é a vez de os destinatários tomarem a palavra para, na primeira pessoa do plural, se comprometerem a pagar de renda mais um sesteiro por cada boi usado na agricultura, como contrapartida para serem ouvidos na escolha do alcaide; de igual modo, tomam a palavra para corroborarem a cláusula cominatória, assumindo as consequências de uma eventual inobservância dos compromissos assumidos pela sua parte. Este “diálogo”, que reflecte a intervenção das partes no processo negocial, é ainda mais flagrante no foral de de Seia[95], onde claramente se evidenciam dois discursos diversos, o do primeiro outorgante e o dos moradores, que chamam a si a palavra a partir da cláusula em que se trata da reconstrução dos muros da alcáçova: “Si muro cadere et fuerit pro facere que ponat illo seniore mozom et luria et marra et malios et II.as lavancas et nos nostros corpos et illo muro sedeat factum”.

 Pouco sabemos acerca do modus operandi dos funcionários encarregados da redacção definitiva dos forais, já que normalmente, como observámos, conhecemos estes apenas na sua forma definitiva.

Embora antecipadamente possamos estar certos de que o protocolo inicial assim como a sanctio, a corroboratio (validação) e o escatocolo final equivaliam em regra ao que era usual na época, em situações de idêntica importância, o dispositivo correspondia aos propósitos e aos objectivos concretos que conduziram à elaboração do documento e aos aspectos que tinham sido ponderados, estudados e eventualmente negociados com os destinatários, na fase preliminar a que fizemos referência.

O conhecimento de outras cartas anteriormente elaboradas, cujos destinatários tinham sido as comunidades próximas daquela de que agora se tratava, permitiu que muitas das cláusulas nelas contidas se considerassem adequadas para traduzir aquilo que se pretendia, por corresponderem a necessidades e a pressupostos comuns, e que portanto se reproduzissem. Por razões que nos escapam, o foral de Barcelos [1166-1167][96] acabou por se cristalizar num texto que não tinha nascido para se tornar definitivo, mantendo a aparência de uma minuta. O de Vila Nova (Famalicão)[97], em 1205, documenta de um modo ainda mais interessante este processo de elaboração, em que, sob um determinado aspecto (o das coimas), se tomam como referência os procedimentos adoptados nas terras dependentes da Ordem do Hospital, sob outro (o das bestas de carga), se invoca o foral de Guimarães e, sob outros (portagens), se declara adoptar os usos da povoação que se formara à volta do mosteiro de Rates.

Na grande maioria dos casos, mais do que à reprodução isolada de cláusulas e preceitos concretos, recorreu-se à reprodução de todo um texto paradigmático, sem alterações ou apenas com ligeiros ajustamentos, por se considerar esse o mais adequado meio de responder a situações comuns aos povos de uma determinada área geográfica ou de áreas geográficas dotadas de uma certa afinidade.

        Há algumas situações que nos podem ajudar a estabelecer o paralelismo com o que sucederia com a publicitação dos forais depois da sua outorga. Em 1301, reuniram-se na colina de Celeirós os habitantes de Montenegro: “XII dias andados do mes de Juyo chamados os homeens e o poboo da terra de Monte Negro per Vicente Anes homem e porteiro do muyt alto e muy nobre Senhor Dom Denis pela graça de Deus Rey de Portugal e do Algarve, de mandado de dom Eytor Vicente vassalo e pobrador do dito nosso Senhor el Rey pera virem a este dia ao logar que chamam Celeyroos, a ouvir mandado de nosso Senhor ElRey sobr’ o foro de vila que lhy mandarom pedir a elRey que lhys desse en essa terra de monte Negro (...) esse poboo chamado e apregoado como dicto he no dicto logar de Celeyroos, o dicto Eytor Vicente mostrou e leer fez perdante esse poboo hūa carta aberta e seelada do seelo pendente de nosso Senhor elRey”[98]. Quando foi criada a feira mensal de Valença, em 1315, D. Dinis ordenou ao concelho “que façam apregoar como aia esta feira e en qual dia de guisa que seia sabuda e pobricada per toda a terra e que o sabham os mercadores e os outros que a ela quiserem vyr”[99]. Situação idêntica se deu em Bouças quando, em 1284, D. Dinis mandou o tabelião convocar os moradores: “Mandovos que logo vista esta carta aprazedes o poboo de Bouças que seiam per ante mim sabado primeyro que vem e se algūa carta ou cartas teem de foro dessa terra adugan’as e eu veerey todo e farey aquelo que per vir por dereyto”[100]. Bastam estes exemplos para comprovar como era usual convocar os habitantes de uma localidade a reunirem-se num lugar determinado, quando era necessário dar-lhes a conhecer alguma determinação superior ou ouvi-los acerca da maneira de resolver os problemas colectivos. Isso acontecia mesmo antes de as localidades se transformarem em municípios: um documento mais tardio, de 1431, relativo ao julgado de Penafiel dá ao lugar onde se faziam as assembleias o nome de foral: "No carvalho de Sete Pedras, foral onde se fazem as audiências do Julgado de Penafiel"[101]. Com frequência, esse local era o adro da igreja paroquial e as reuniões tinham lugar à saída da missa dominical. Mais à frente, faremos uma referência mais detalhada aos locais onde se faziam as assembleias do concelho.


[1] Tomás Muñoz y Romero, Colección de Fueros Municipales y Cartas Pueblas de los reinos de Castilla, León, Corona de Aragón y Navarra. Madrid, J. M. Alonso, 1847 (fac-simile, Madrid, Atlas, 1978), p. 27-30.

[2] Esta referência explícita ainda não aparece nos foros de Brañosera (Tomás Muñoz y Romero, ibidem, p. 16-18), para podermos retrotrair essa data ao século IX, embora os povoadores já sejam aí tratados como uma comunidade solidária.

[3] T.T., F.A., m. 8, n.º 6. Publ. em D.M.P.-I, p. 71. Sobre este assunto, cf. Maria Helena da Cruz Coelho, O conjugar da tradição e inovação: no concelho de S. Martinho de Mouros, em “Revista de História” X (Centro de História da Universidade do Porto, 1990), p. 17-25.

[4] T.T., Livro Preto da Sé de Coimbra, fl. 7-8 v.º. Publicado em Rocha Madahil, Livro Preto da Sé de Coimbra. vol. I, Coimbra, Arquivo da Universidade, 1977, p. 21-24.

[5] T.T., Livro Preto da Sé de Coimbra, fl. 10. Publ. ibidem, p. 29-31.

[6] P.M.H.-D.C., p. 544-545. Filomeno Amaro Soares da Silva, Cartulário de D. Maior Martins (século XIII), Arouca, Associação da Defesa do Património Arouquense, 2001, p. 40-41.

[7] P.M.H.-D.C., p. 544-545.

[8] T.T., F.A., m. 3, n.º 7 (Foral de Soure).

[9] Resumimos seguidamente e, em alguns aspectos, completamos o estudo sobre a designação dos forais publicado em apêndice em Origens dos Municípios Portugueses (1.a ed., p. 291-299, 2.ª ed., p. 231-236).

[10] Numerosos autores se têm debruçado sobre as origens e a evolução etimológica da palavra “foro”. Cf. Paulo Merêa, Em torno da palavra “forum”, separata da “Revista Portuguesa de Filosofia”, vol. I, t. I, Coimbra, 1948; Alfonso García Gallo, Aportacion al Estudio de los Fueros, “A.H.D.E”, XXVI (1956), pp. 387-411; Juan Antonio Sardina Paramo, El Concepto de Fuero, Santiago de Compostela, 1979, p. 15-41.

[11] Mais extensamente, cf. António Matos Reis, Origens dos Municípios Portugueses, 1.ª ed., Lisboa, 1991, p. 292-296 (ibidem, 2.ª ed., 2002, p. 232-235).

[12] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 166.

[13] T.T., Ch. D. Af. IV, liv. IV, fl. 67.

[14] T. T., Ch. D. Pedro I, liv. I , fl. 44 v.º. Publ. em A. H. de Oliveira Marques e outros, Chancelarias Portuguesas, D. Pedro I, Lisboa, 1984, p. 186.

[15] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 186 v.º.

[16] T. T., Ch. D. Pedro I, liv. fl. 59. Publ. cit., p. 240.

[17] T. T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 130. Publ. cit., p. 560.

[18] José Angel García de Cortázar e outros, Organización social del espacio en la España medieval. La Corona de Castilla en los siglos VIII a XV, Barcelona, Ariel, 1985, p. 60. Já anteriormente nos referimos a S. João da Pesqueira nesta perspectiva: António Matos Reis, Origens dos Municípios Portugueses, 1.ª ed., Lisboa, 1991, p. 34-35 (ibidem, 2.ª ed., 2002, p. 38-40).

[19] T.T., F.A., m. 12, n.º 3, fl. 22-23 v.º; F.S.C., fl. 2 v.º-3; F.V., fl. 67.

[20] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 16-16 v.º.

[21] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV fl. 97 v.º.

[22] Cartório do Mosteiro de Lorvão, Gav. 6, m. 6, n.º 14, ord. 1. Incluída em instrumento de 26 de Maio da Era de 1358, do qual consta ter o mosteiro escambado com El-Rei um casal que possuía em Gondarém por um casal e meio situado na freguesia de Parada, concelho de Arcos de Valdevez. Publ. João Pedro Ribeiro, Dissertações Chronológicas e Críticas, Lisboa, 1813, t. III, p. 120-122.

[23] T.T., Ch. D. Af. III, liv. I, fl. 135 v.º.

[24] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 16-16 v.º.

[25] Sic.

[26] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 98.

[27] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 97 v.º.

[28] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 115.

[29] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 52 v.º.

[30] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 40.

[31] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 74 v.º.

[32] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 111-112.

[33] T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 76 e 104 v.º.

[34] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 74 v.º.

[35] Arquivo Municipal de Viana do Castelo, Pergaminho n.º 2, série 2.

[36] T.T., Gav. 08, m. 4, doc. n.º 17.

[37] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 98.

[38] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 10-10 v.º.

[39] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 16-16 v.º.

[40] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 64.

[41] T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 90 v.º-91.

[42] T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 116.

[43] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 54-54 v.º.

[44] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 98 v.º.

[45] T.T., F. A., m. 12, n.º 3, fl. 4 v.º; F.S.C., fl. 32; F.V., fl. 53.

[46] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 108; F.A., m. 9, n.º 3.

[47] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 29 v.º.

[48] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 16-16 v.º.

[49] Cartório do Mosteiro de Lorvão, Gav. 6, m. 6, n.º 14, acima citado.

[50] Em alguns documentos a designação de sesmeiros aplica-se não aos distribuidores mas aos destinatários da distribuição das terras, como sucede num documento de 1293, relativo a Évora Monte: T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 47 v.º-48. Sobre sesmos e sesmarias cf. o capítulo X da 3.ª parte (n.º 2.2.1).

[51] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 77 v.º.

[52] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 73 v.º.

[53] T.T., Ch. D. Fern., liv. II, fl. 1 v.º.

[54] T.T., Ch. D. Fern., liv. II, fl. 99.

[55] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 45. Foral publicado por José Marques, Os Forais da Póvoa de Varzim e de Rates. Póvoa de Varzim, Câmara Municipal, 1991. 

[56] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 58 v.º

[57] Em relação a Vila Real, cf. T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 268 v.º.

[58] T.T., Ch. D. Af. III, liv. I, fl. 36.

[59] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 148 v.º.

[60] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 72.

[61] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 53 v.º.

[62] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 53 v.º.

[63] T.T., Ch. D. Af. IV, liv. IV, fl. 101.

[64] T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 65.

[65] T.T., Ch. D. Pedro I, liv. I, fl. 62.

[66] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 162 v.º.

[67] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 27 v.º.

[68] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 18.

[69] Embora centrado sobre uma época diferente, cf. o estudo de Humberto Baquero Moreno, A acção dos almocreves no desenvolvimento das comunicações inter-regionais portuguesas nos fins da Idade Média, Porto, 1979; do mesmo autor, A importância da almocrevaria no desenvolvimento dos Concelhos durante a Idade Média, em Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI. Estudos de História. Lisboa, Editorial Presença, 1986, p. 167-176; Alguns documentos para o estudo das estradas medievais portuguesas, em “Revista de Ciências do Homem”, n.º 1, série A, Lourenço Marques, 1970, p. 97-110.

[70] Cf. Virgínia Rau, Feiras Medievais Portuguesas, 2.ª ed., Lisboa, 1983. Sobre o mercado, ao nível da Península Ibérica, cf. Luis García de Valdeavellano, El mercado. Apuntes para su estudio en León y Castella durante la Edad Media, em  “A.H.D.E.”, 8 (1931), 201 ss.

[71] Os castelos medievais têm sido objecto de alguns estudos que privilegiam o período que se inicia em meados do século XIII: Humberto Baquero Moreno, Os Castelos Portugueses (1350-1450), em Livro do Congresso. Segundo Congresso sobre Monumentos Militares Portugueses, Lisboa, 14 a 19 de Junho de 1983, p. 113-117; José Marques, Os Castelos Algarvias da Ordem de Santiago no reinado de D. Afonso III, em “Caminiana”, ano VIII, n.º 13 (Dez. 1986), p. 9-37; Mário Jorge Barroca, D. Dinis e a Arquitectura Militar Portuguesa, em IV Jornadas Luso-Espanholas de História Medieval. As relações de fronteira no século de Alcanices. Actas, vol. 1, Porto, 1998, p. 801-822; João Gouveia Monteiro, Os Castelos Portugueses dos finais da Idade Média, Lisboa, Edições Colibri, 1999.

[72] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 78 v.º-79.

[73] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 59-60 v.º.

[74] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 69.  Publicado por José Marques, D. Afonso IV e a construção do alcácer do castelo de Olivença, Porto, 1985 (separata da “Revista da Faculdade de Letras – História”, Porto, II série, vol. II, 1985, p. 59-79), p.17-18.

[75] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 23 v.º.

[76] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 247 v.º-248 v.º.

[77] T.T., Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 97 v.º.

[78] T.T, Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 67 v.º-68.

[79] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 118 v.º.

[80] T.T., Ch. D. Af. IV, liv. IV, fl. 75 v.º-76. Publ. em Chancelarias Portuguesas. D. Afonso IV, vol. III, cit., p. 145-148. 

[81] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 108.

[82] T.T, Ch. D. Dinis, liv. IV, fl. 91.

[83] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 98.

[84] Sobre esta temática, especialmente para os primeiros séculos, cf. James F. Powers, A Society Organized for War, Califórnia, 1988; para os séculos posteriores, cf. João Gouveia Monteiro, A Guerra em Portugal nos finais da Idade Média, Lisboa, Editorial Notícias, 1998.

[85] T.T., F.A., m. 3, n.º 2; F.A., m. 7, n.º 7; F.A., m. 12, n.º 3, fl. 1; F.V., fl. 22. Foral de Penela, de Julho de 1137.

[86] Nos forais de Castelo Rodrigo menciona-se uma prática curiosa em relação à fiança ou caução que o munícipe devia apresentar em certas circunstâncias e que devia concretizar-se na entrega de uma “besta morta”, para valores até um morabitino, ou de uma “besta viva”, daí para cima. Se esta corresponderia literalmente a um animal vivo, a “besta morta” consistia num conjunto de armas formado por “un capelo de ferro o espada o baesta con una corda e con avancorda e con cinto e con LX.ta saetas o un escudo con braceyras” (Foros de Castelo Rodrigo, cap. II, n.º 9). A própria retribuição a que os guerreiros teriam direito dependia das peças do seu equipamento defensivo, admitindo um certo número de variações: “qui levare loriga o lorigon o capelo, de L cavalerias ou dende arriba, leve seu dereyto; e dende a iuso, nada. E esto he dereyto: IIII capelos, I.ª cavaleria; loriga o lorigon con almofar, I.ª cavalaria; o lorigon con capelo, I.ª cavaleria; brafoneras, I.ª quarta; lorigon sin capelo, sin almofar, media cavaleria” (Foros de Castelo Rodrigo, cap.VIII, n.º 27).

[87] Sobre a importância que posteriormente viriam a ter, cf. Humberto Baquero Moreno, Quelques aspects des villes médiévales portugaises. Les corps militaires et la démographie. Em Villes et Sociétés Urbaines au Moyen Age. Hommage à M. le Professeur Jacques Heers. Paris, Presses de l’Université de Paris-Sorbone, 1994, p. 113-118.

[88] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 148.

[89] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 126.

[90] T.T., Ch. D. Af. IV, liv. IV, fl. 32.

[91] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 131 v.º.

[92] T.T., Ch. D. Fern., liv. I, fl. 129 v.º.

[93] T.T., Livro Preto da Sé de Coimbra, fl. 8-8 v.º; Sé de Coimbra, m. 1.

[94] T.T., Livro Preto da Sé de Coimbra, fl. 255 v.º.

[95] T.T., F.A., m. 12, n.º 3 fl. 11; F.S.C., fl. 6; F.V., fl. 28 v.º.

[96] T.T., F.A., m. 12, n.º 3, fl. 16; F.S.C., fl. 16; F.V., fl. 68 v.º.

[97] T.T., F.A., m. 12, n.º 3 fl. 4 v.º; F.S.C., fl. 32; F.V., fl. 53.

[98] T.T., Ch. D. Dinis, liv. II, fl. 16-16 v.º.

[99] T.T., Ch. D. Dinis, liv. III, fl. 90 v.º.

[100] T.T., Ch. D. Dinis, liv. I, fl. 233-233 v.º.

[101] Documento do mosteiro de Bostelo cit. em J. S. R. Viterbo, Elucidário de Palavras, Termos e Frases ..., 2.º vol., ed. crítica, 1984, p. 278.